31 de julho de 2025

Nordeste e a Crise Política.

Deputado diz que não vai tirar o botom com vergonha de sua condição de políico; Parlamentar maranhense, ao analisar a crise política, diz que gosta do Brasil

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( Brasília-DF, 14/07/2005)  Deputado Gastão Vieira(PMDB-MA),  um dos mais presentes de sua bancada em manifestações em plenário, falou hoje no Grande Expediente da Câmara dos Deputados para falar da crise política. Quase em tom de verdadeira catarse disse que não vai se esquivar de sua condição de parlamentar para evitar as censuras de rua contra o parlamento e que gosta do Brasil que sai no “Grandes Empresas, Pequenos Negócios” ou no “Globo Rural” e não no Brasil do “Jornal Nacional”  

 

O deputado maranhense foi aparteado por outros recordistas de plenário, como Mauro Benevides(PMDB-CE) e Colbert Martins(PPS-BA).

A Política Real reproduz as falações, na íntegra:

 

“ Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, esta é a terceira vez que ocupo esta tribuna para analisar a crise política que vivemos no País.

 

Tenho, e continuarei tendo, orgulho de ter escolhido a política a razão das minhas atividades. Não vou, em nenhuma hipótese, tirar este distintivo da lapela, para não enfrentar as críticas daqueles que, na sociedade, não compreendem, nem aceitam, o momento político que vivemos.

 

Desejo colocar a pouca experiência política que tenho para contribuir na busca e no êxito para a saída política desta crise. A grande maioria da Casa não contribuiu para que ela se estabelecesse.

 

Em ocasiões anteriores, tive oportunidade de falar da solidão que sente o Deputado que chega no plenário, onde, praticamente, não é ouvido. Suas opiniões têm campo mais fértil no trabalho das Comissões. A Casa tem como tradição permitir que um número pequeno de Parlamentares, mas muito importante, condicione suas decisões, seus caminhos e conseqüências, quando tomadosde forma equivocada. Homens importantes, que ocuparam posições de destaque nos seus Estados, acostumados a trabalhar 14, 16 horas por dia, muitas vezes, têm de esperar, em frente à televisão, o intervalo de uma votação nominal para outra, para participar das decisões nacionais, que estão sendo tomadas por uma minoria repito neste plenário.

 

Ouço, com prazer, o nobre Deputado Mauro Benevides.

 

O Sr. Mauro Benevides - Deputado Gastão Vieira, no momento em que V.Exa. faz alusão ao desempenho do nosso mandato, na condição de representante do povo brasileiro, dizendo que nossa jornada de trabalho extrapola em muito o que seria normal a qualquer cidadão, permito-me lembrar a V.Exa., talvez, um fato inusitado na tradição mundial do Parlamento. Certa vez, no dia 25 de dezembro,

 

 

Quero lembrar a V.Exa. que certa vez, no dia 25 de dezembro, dia de Natal, o Congresso brasileiro se reunia por minha convocação para deliberar em torno de uma matéria de extrema importância, que era aquele processo de impeachment de um então Presidente da República, que, no juízo da maioria, se distanciara de princípios éticos inarredáveis. Veja V.Exa., dia de Natal, dia 25 de dezembro, o Congresso foi convocado. Lá estavam presentes Senadores e Deputados. Não em um número avantajado, mas um número que nos permitiu atingir os objetivos regimentais, mostrando que aquele punhado de bravos estavam ali, absolutamente conscientes da necessidade de cumprir o dever em tempo hábil. Por isso, por respeitar prazos de acusação e de defesa, fizemos uma reunião, no dia 25 de dezembro de 1992. Veja V.Exa., com esse exemplo, que estamos cônscios de nossas responsabilidades e cumprimos o nosso dever com aquela preocupação de corresponder aos anseios da comunidade.

 

O SR. GASTÃO VIEIRA Agradeço a V.Exa., nobre Deputado Mauro Benevides, decano de nosso partido, e volto a afirmar que queremos contribuir de forma a decidir para sairmos desta crise política que não criamos.

 

A grande maioria parlamentar que tem assento nesta Casa não criou esta crise. Esta crise tem origem no Poder Executivo que poderia, ou pela força dos votos, que trouxe o Presidente Lula para a Presidência da República, fazer a reforma com a nossa adesão, ou buscar neste Plenário Parlamentares que se identificam com o Governo, com a postura do Governo, com as propostas do Governo e atrair estes Parlamentares para o partido do Governo, ampliando, portanto, a bancada do partido do Governo e ampliando a bancada dos partidos de Esquerda que tinham uma identificação e que poderiam fazer uma grande frente de apoio ao Governo no encaminhamento e na votação das reformas que o País precisava.

 

Isto não foi feito e nós não temos culpa disso.

 

A grande maioria desta Casa, vamos pegar os mapas de votação, não negou apoio à reforma tributária, à reforma da Previdência, discordou. Eu votei contra a taxação dos inativos, mas no conjunto geral da reforma da Previdência apoiei o Governo.

 

Líderes que iam ao Palácio do Planalto, que negociaram os grandes temas, muitas vezes não repassavam isso para suas bancadas ou, o que é pior, não tinham a adesão das bancadas porque, muitas vezes, tomaram decisões equivocadas.

 

Mas quem vive este clima é o conjunto desta Casa. Somos cobrados nas ruas e nos lugares públicos por onde passamos como se esta crise fosse de todos nós, mas não é, Deputado Luiz Couto. Nós, solitários participantes, muitasvezes, das decisões desta Casa temos de compreender este momento e exigir daqueles que têm responsabilidade por esta crise que criem caminhos e alternativas para que ela não permaneça. Com o maior respeito a V.Exa., comecemos pelo próprio partido do Governo, o Partido dos Trabalhadores, que tem de fazer a separação do Governo, tem de criar um programa para chegarmos até o final do mandato do Presidente Lula.

 

O Governo, até a semana passada, parecia completamente desorientado para enfrentar esta crise. Ainda bem que os jornais publicaram a pesquisa CNT/Censo. Ela divulgou que a popularidade do Sr. Presidente da República não foi ainda alcançada por este desastre político. E há notícias positivas do Governo, como a viagem do Exmo. Sr. Presidente à França. Ontem, a data mais importante para os franceses, quando o sentimento de luta e liberdade daquele povo melhor se expressa, o Sr. Presidente da República, ao contrário do que muitos desejavam, foi aplaudido por sua participação numa solenidade pública naquele país. É o início de uma agenda positiva que mostra que o Governo começa a reagir diante dessa crise.

 

É muito pouco. A desorientação ainda parece estar presente. A reforma ministerial que está sendo feita pode ser uma reforma para dar unicidade ao Governo, para permitir ao Governo avançar nos seus aspectos administrativos, mas eu tenho dúvidas e muitas, Sr. Presidente de que essa reforma possa acrescentar ao Governo a base de sustentação de que ele tanto precisa neste momento.

O Governo parece não saber administrar crises e parece querer criar factoides para enfrentá-la. Não posso aceitar que se diga a um Ministro V.Exa. sósia se quiser, e que no dia seguinte esse Ministro tão importante, que merece uma expressão de solidariedade pública do Presidente da República, perca o status de Ministro. Parece que não há uma certeza do que fazer.

 

Ontem, o eminente Ministro Jaques Wagner traz uma explicação tão simplória para o episódio que envolve o filho do Presidente, que seria melhor dispensá-lo de fazer esse comentário. Se a crise não chega ao Presidente, e nós acreditamos e repetimos isso aqui, neste Plenário várias vezes, não precisa envolver a família do Presidente, é ele próprio que representa neste momento que os gestos que estas acusações não o atingem e não atingem o seu Governo.

 

Demora-se muito a fazer uma agenda positiva para este País. É preciso que haja uma agenda e, a partir dela, que chamemos os atores capazes de sentarem-se a uma mesa e fazerem com que essa agenda torne-se uma realidade.

 

Temos falado aqui muito sobre a reforma política. Está no íntimo, na nossa consciência, na nossa experiência a certeza de que é inadiável a reforma política. Mas ouço muitos Líderes dizerem aqui que não há mais tempo, que não dá mais tempo porque provavelmente os Líderes terão condições de enfrentar e vencer as eleições de 2006, o que talvez não possa acontecer com a maioria daqueles que sofrem a solidão desta Casa e a solidão deste Plenário. Temos de fazer e temos condições de fazer a reforma política, votando na Câmara e no Senado até outubro.

 

 

Mas, muitos desestimulam-nos, quando falamos da necessidade da reforma política, assunto sobre o qual estamos ouvindo nas nossas bases. Nos pequenos Municípios e nas reuniões de companheiros que fazemos, a resposta vem sempre assim: Não há tempo; vamos deixar as coisas nesse determinismo que vai nos levar, todos, a um grande fracasso político. Não se fala na reforma do Judiciário.

 

Precisamos arrumar este País como um todo.

 

Alguns, nobre Presidente, dizem que o Presidente Lula preside o fim de um ciclo político que começa com a redemocratização do País. Não penso assim. Acho que S.Exa pode iniciar um novo ciclo que, passando a limpo as Instituições do País, permita a este País viver um novo momento com crescimento sustentado e, acima de tudo, com mais equilíbrio e justiça social. Mas, para isso, é preciso fazer o que se deve e, não o que se pode.

O próprio Supremo Tribunal Federal li, recentemente, artigo do Professor Joaquim Arruda Falcão encomendou um trabalho, no qual mostra que quer enfrentar a sua reforma de uma forma estratégica. Edescobre, Presidente Luiz Couto, coisas interessantes, as quais passo a ler:

 

Quando o acervo de decisões, aguardando julgamento, uma classificação por assunto de quase cem mil processos parados no Supremo Tribunal Federal, mostrou que 58% envolvem apenas 45 questões jurídicas.

 

Ou seja, as causas repetidas são o grande vilão, a verdadeira origem dos problemas enfrentados pelo Poder Judiciário. Julga-se muito sobre muito pouco, diz o eminente Professor Joaquim Arruda Falcão. E completa: se o Supremo conceder prioridade na pauta, para o julgamento dessas quarenta e cinco questões recorrentes, em pouco tempo, o acervo de processos poderá cair, praticamente, para a metade.

 

Mas todas as vezes em que se tenta discutir a reforma do Judiciário, vem o chavão Querem tirar a nossa independência; querem interferir na nossa autonomia. E não se faz nada; continuamos no mesmo ponto.

 

 

Estamos vivendo um grande momento da Polícia Federal, que tem hoje o papel que o Ministério Público Federal tinha no Governo Fernando Henrique. É preciso, porém, exigir que essa ação tenha regras absolutamente claras. O País precisa saber de que forma a Polícia Federal vai agir e como as pessoas serão protegidas em seus direitos assegurados pela Constituição.

 

Sr. Presidente, no exercício do meu mandato não posso aceitar que uma pessoa presa preste uma informação que afete a segunda maior federação de indústrias do Brasil. Essa pessoa em qualquer país teria sua palavra sob suspeição, mas no Jornal Nacional virou uma grande verdade. Nesse clima que estamos vivendo, como pode uma pessoa que não tem condições de conviver harmonicamente em sociedade, razão pela qual estápresa, acusar 3 ex-Ministros de Estado de uma única Pasta e uma federação da qual participam mais de 100 sindicatos, envolvendo todos em uma acusação de que alguém pegou uma mala, bateu à porta da Federação e recebeudinheiro para não ser fiscalizado.

 

 

Não sou ingênuo de pensar que essas coisas não podem ocorrer. Acredito que alguns podem proceder assim, mas dizer que o conjunto geral dos empresários do Rio de Janeiro está praticando esse ato, acusados por uma pessoa, repito, que está presa, é demais para minha ingenuidade e muito pouco para minha indignação.

 

Na verdade, estamos em um momento muito grave na história deste País, menos pelo que se diz e muito mais grave porque não encontramos alguém que tome o controle da situação e proponha ao País um grande pacto com uma agenda anteriormente definida para que se possa vislumbrar o fim desta crise que está virando paranóia.

 

Nesta semana, divulgou-se uma lista, segundo se dizia nos corredores, de 1.500 assessores que passaram pelo Banco Rural.

 

O Banco Rural está num prédio público, onde há dentista, banco, comerciante, tudo. Ele passa a ser maldito, quem entrou lá, foi buscar mensalão para alguém.

 

Tenho um amigo dos Estados Unidos, nobre Deputado Colbert Martins, que diz: O seu País é fantástico! Vocês estão criando a maior crise do mundo sem nenhuma prova atéagora. Ela já se arrasta há mais de 40 dias, por que temos de ficar, de novo, silenciosamente, neste plenário, curtindo a nossa solidão e vendo a instituição política afogar, o Deputado ter vergonha de ser Parlamentar e esconder essa lapela, quando entra no avião com medo de tomar vaia? Eu penso que não. Temos de reagir, se nossos Líderes estão acuados, o problema é deles, temos de reagir, porque muitas vezes discordamos daquilo que foi decidido pelos nossos Líderes em nosso nome. É preciso saber que a raiz dessa crise pode estar no exercício de uma Liderança que não impunha respeito, solidariedade e compreensão do liderado.

 

O Sr. Colbert Martins V.Exa. Concede-me um aparte, nobre Deputado Gastão Vieira?

 

O SR. GASTÃO VIEIRA Pois não, Deputado Colbert Martins.

 

O Sr. Colbert Martins Acompanho, solidarizo-me e concordo com o pronunciamento que V.Exa. transmite a todos neste instante. É preciso que cada vez mais nos aprofundemos de forma mais célere e mais adequada para que os culpados, se houver, sejam verdadeiramente imputados. Por enquanto, penso que seja necessário que na CPI, além dos depoimentos, haja investigações aprofundadas e adequadas. Não necessitamos de foco, televisão ou holofote, mas de trabalho, para que vejamos as movimentações bancárias, as ligações telefônicas e que se façam as ilações, para que sejam produzidas provas. Estamos nisso há cerca de 45 dias e épreciso que essas provas apareçam, porque a Nação deseja que se ocorrerem punições, que aconteçam com bases não apenas em suposições, mas em fatos que sejam comprovados. Concordo com V.Exa. que a maior força que temos de ter na nossa defesa é abrirmos cada vez mais o que tivermos de abrir e investigarmos profundamente de forma responsável, para que não vejamos espetáculos da mídia, como os que estão aparecendo a cada dia em lugares diferentes e que podem de alguma forma nos atingir. Concordo com V.Exa. e o parabenizo pelo seu pronunciamento.

 

 

O SR. GASTÃO VIEIRA Nobre Deputado, V.Exa. me deu o fecho de meu discurso. Gosto de usar a expressão solidão deste plenário, porque ela significou muito para mim, no meu primeiro mandato, em 1995. Em fevereiro, quando você chega a esta Casa, tem a impressão de que é importantíssimos, todos lhe conhecem pelo nome e lhe cumprimentam. Rapidamente, você descobre que isso se dá porque haverá eleição de Mesa, de Comissão e de Líder.

 

Acabada essa fase, encontramos dificuldade em tudo nesta Casa: de saber o que se passa, de conseguir um lugar numa Comissão, de viabilizar suas demandas. Enfim, há uma solidão concreta, porque esta Casa, infelizmente, não cria condições para que a grande maioria dos Parlamentares participe das grandes e quem sabe das pequenas decisões.

 

Tenho certeza de que esses solitários não temem nenhuma investigação. Que se faça as investigações, mas que se faça com seriedade. Nunca gostei de participar de CPI. Não tenho condições de ter informações que me permita fazer boas perguntas. Talvez não tenha uma assessoria que me forneça boas perguntas no sentido de esclarecer os fatos. Muitos, por origem, por candidaturas, fazem aquilo que Machado de Assis dizia: suam pensando que estão fazendo política. Nada avança e a sociedade continua, cada vez mais, pensando que nós constituímos um grupo de pessoas que não merece o respeito da Nação.

 

Sr. Presidente, gosto do Brasil que passa no Globo Rural e no Pequenas Empresas & Grandes Negócios. Não gosto do Brasil que passa no Jornal Nacional. Eu gosto do brasileiro que não deseja nenhum tipo de golpe, que, ao responder a pesquisa CNT Censo, diz confiar na democracia e desejar que o Presidente seja julgado nas urnas, o ano que vem. É este País, quase irreal, que não aparece, que está a exigir de nós, Parlamentares, uma postura que permita sairmos desta crise, mantendo a dignidade do Poder Legislativo e a nossa certeza de que é bom ser político, de que é sério ser político e, acima de tudo, de que essa atividade é muito digna.

 

Muito obrigado.”

 

( da redação com informações da taquigrafia da Câmara dos Deputados)