ESPECIAL DE FIM DE SEMANA: Parecer do TCU serve para argumentos opostos
O líder do PSDB no Senado vê rejeição das contas de Dilma como prova de crime de responsabilidade. O do PT considera-a apenas como opinião a ser derrotada pelo Congresso
(Brasília-DF, 09/10/2015) O parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), rejeitando por unanimidade dos votos de seus ministros as contas do governo da presidenta Dilma Rousseff em 2014, que chegou ao Congresso Nacional nesta sexta-feira, 9, é encarado de forma amena pelo líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE). Já para o líder do PSDB também no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), é prova definitiva de que houve estelionato eleitoral, abuso de poder político, abuso de poder econômico e crime de responsabilidade.
Humberto Costa argumenta que se trata apenas e tão-somente de uma “opinião” de um órgão auxiliar do Poder Legislativo que pode ser acatado pelo Congresso Nacional ou não. “É um órgão de apoio, é um órgão de auxílio ao Poder Legislativo e aquilo que ele emite, um parecer, é uma opinião. Eu lembro, por exemplo, que muitas e muitas vezes o Tribunal de Contas determinou que determinadas obras deveriam ser suspensas por considerar que havia algum tipo de suspeita de superfaturamento e o Congresso Nacional, no momento de avaliar o orçamento, teve uma posição diferenciada”, afirma o líder do PT, em entrevista a Política Real.
"Desmoralização"
“Em primeiro lugar, não é uma opinião. É um parecer. Parecer baseado em elementos técnicos e documentos oficiais na escrita pública, na contabilidade pública. Uma coisa é você ter uma opinião sobre uma partida de futebol. Eu posso ter uma, você pode ter outra. Outra coisa é você ter um parecer, né, técnico sobre um fato, uma realidade”, rebate o líder do PSDB, igualmente em entrevista a Política Real.
“Então não há de se confundir parecer com opinião. Tanto que o nome técnico não é opinião do Tribunal de Contas, é o parecer do Tribunal de Contas. E é claro que o Congresso não vai jogar uma instituição de mais de 100 anos, criada por Rui Barbosa, na cova dos leões. Seria a desmoralização completa do Tribunal de Contas e seria a desmoralização absoluta do Congresso Nacional”, acrescenta Cássio Cunha Lima.
"Não é autônomo"
“Como eu já disse. Em vários momentos o Congresso Nacional teve entendimentos diferentes daquele que teve o Tribunal de Contas da União. Até porque o tribunal não é autônomo, ele não é integrante do Poder Judiciário e ele serve para ajudar o Poder Legislativo a tomar as suas posições no que diz respeito a temas relativos ao orçamento, a contas, a obras, enfim. Então, por essa razão, eu acredito que o Congresso Nacional pode sim, e deve ter uma opinião diferenciada dessa que foi apresentada”, contra-argumenta Humberto Costa.
O documento do TCU rejeita as contas de 2014 do governo Dilma Rousseff por considerar que houve irregularidades, como as “pedaladas fiscais”. “Como eu já disse. Em vários momentos o Congresso Nacional teve entendimentos diferentes daquele que teve o Tribunal de Contas da União. Até porque o tribunal não é autônomo, ele não é integrante do Poder Judiciário e ele serve para ajudar o Poder Legislativo a tomar as suas posições no que diz respeito a temas relativos ao orçamento, a contas, a obras, enfim. Então, por essa razão, eu acredito que o Congresso Nacional pode sim, e deve ter uma opinião diferenciada dessa que foi apresentada”, afirma o líder do PT.
Leia a íntegra das entrevistas de Cássio Cunha Lima e de Humberto Costa
Íntegra da entrevista de Cássio Cunha Lima
Por que o senhor diz que desta vez o governo Dilma acabou?
Porque ela perdeu a última chance de ter, para criar o mínimo de governabilidade com a reforma ministerial que foi um fiasco. Além de ter repetido os velhos métodos do toma-lá-dá-cá, métodos que a sociedade não tolera mais, e foram exatamente esses métodos de aparelhamento de Estado, de ocupação da máquina pública por partidos e políticos que escancarou a porta da corrupção. E o Brasil vive toda essa crise por essa prática política.
Então, ao invés de ela ter tentado outro caminho, ela repetiu o caminho. Só que de forma desastrosa porque a reforma não durou 48 horas. Olhe que ela teve, pela primeira vez se viu na história do Brasil uma presidente foi falar com a imprensa pra dizer ‘estou nomeando o novo ministro da Saúde e novo ministro da Educação, por exemplo, pra melhorar nisso, nisso, nisso, pra atingir tais e tais metas pra cumprir tais e tais objetivos’.
Não. Não fez uma palavra sobre a melhoria da prestação de serviço na educação e na saúde. Ela disse com todas as letras ‘estou nomeando pra conseguir mais votos na Câmara dos Deputados e escapar do impeachment’. É o fim do mundo! É o caos! Uma situação incontrolável.
E quando um governo perde popularidade é ruim. Mas muitos governos escapam sem popularidade. Quando perde credibilidade aí a situação já fica mais grave. E é o caso dela. Agora, quando o governo além de não ter credibilidade vira motivo de chacota, de piada, aí fica insustentável. E a presidente da República virou motivo de piada porque em meio a essa crise ela vai pra ONU e fala em armazenar vento, como foi dito.
Então é uma situação muito grave. É um momento em que temos de ter calma, muita calma. Temos de ter muita serenidade e responsabilidade, mais firmeza pra conduzir o país pra os dois caminhos que estão postos. Você tem um caminho pela via da política, uma solução dos políticos. Pela democracia representativa, que é o impeachment.
Tem um outro caminho, que é o que eu prefiro, que é o da democracia direta, da via popular, da nova eleição. Porque tanto o Congresso pode impedir o mandato da presidente como o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) pode determinar a realização de novas eleições. Eu acho esta segunda opção muito melhor porque ela garante que, em primeiro lugar, o povo seja o ator principal e não os políticos. Em segundo, ela garante o respeito ao artigo 1º da Constituição que atesta que todo poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido.
Em terceiro lugar, que você confere a um novo governo a legitimidade necessária pra sair dessa situação dramática que o país vive. Então, isso resulta na necessidade de um tempo, pra felicidade nossa, daqui a um ano tem eleição municipal. A justiça eleitoral estará toda mobilizada, não custa um centavo ao Brasil você inseminar a urna eletrônica com um voto pra presidente, sem custo adicional nenhum, e aí nós teríamos, junto com a eleição municipal a possibilidade de escolher um novo presidente para um mandato de dois anos, um mandato de transição, pra tirar o Brasil dessa situação. E quem sabe até possamos encontrar um candidato de conciliação nacional. Alguém que congregue a maioria das forças políticas do país para fazer essa transição.
E o julgamento do TCU entra onde agora?
Como prova definitiva de que houve estelionato eleitoral, abuso de poder político, abuso de poder econômico e crime de responsabilidade. Então, o parecer fulcrado (baseado) num relatório de mais de 1,4 mil páginas, quase 1,5 mil páginas. Um parecer aprovado por unanimidade, sem nenhum reparo, sem nenhuma ressalva, onde todos esses crimes ficaram devidamente comprovados.
A essa altura, o governo da presidente Dilma acabou. Eu não tenho dúvida. Porque se não encontrarmos uma saída dentro da Constituição para que impere a lei, para que a lei seja respeitada, nós jogaremos todo esse esforço institucional por água abaixo, pela janela, porque estará sendo um grande conluio pra manter uma presidente que cometeu delitos no campo fiscal, no campo eleitoral, no que diz respeito à lei orçamentária. E a lei brasileira é muito severa pra punir esses crimes.
O líder do PT diz que o julgamento do TCU é apenas uma opinião. E que a decisão cabe ao Congresso Nacional. O senhor acha que o Poder Legislativo desprezaria um julgamento, por unanimidade do TCU, que é órgão auxiliar do próprio Congresso Nacional?
Em primeiro lugar, não é uma opinião. É um parecer. Parecer baseado em elementos técnicos e documentos oficiais na escrita pública, na contabilidade pública. Uma coisa é você ter uma opinião sobre uma partida de futebol. Eu posso ter uma, você pode ter outra. Outra coisa é você ter um parecer, né, técnico sobre um fato, uma realidade.
Então não há de se confundir parecer com opinião. Tanto que o nome técnico não é opinião do Tribunal de Contas, é o parecer do Tribunal de Contas. E é claro que o Congresso não vai jogar uma instituição de mais de 100 anos, criada por Rui Barbosa, na cova dos leões. Seria a desmoralização completa do Tribunal de Contas e seria a desmoralização absoluta do Congresso Nacional.
Portanto, o se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. O que nos compete neste instante, com muita calma, repito, com extrema responsabilidade é decidir qual o caminho menos traumático pro Brasil. Se será o impeachment ou a realização de novas eleições.
Eu insisto que a realização de novas eleições é o que pode haver de melhor pro país porque toda a sociedade poderá votar. Cada cidadão brasileiro terá participação direta na solução para essa crise. Respeito essa Constituição no artigo primeiro, respeito essa legislação eleitoral e se dá um exemplo definitivo para os políticos brasileiros que para ganhar a eleição não vale tudo, não pode tudo. Porque se prevalecer isso, vai ficar a regra do vale-tudo, pode-tudo. Isso será trágico pro futuro da nossa nação.
Como é que o senhor antevê agora a tramitação desse parecer, desse julgamento do TCU aqui no Congresso Nacional?
Tem um prazo regimental. O presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), receberá o relatório, encaminhará para a Comissão Mista de Orçamento que, por sua vez, através da senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), sua presidente vai designar um relator. Relator este que tem 40 dias para apresentar um parecer. Abre-se mais 15 dias de prazo para apresentação de emendas. Mais 15 dias para o processo de votação e discussão. A partir daí, nasce um projeto de decreto legislativo, que vai recomendar a desaprovação, seguindo a orientação do Tribunal de Contas ou a aprovação das contas. E esse projeto de decreto legislativo será submetido à votação no plenário do Congresso Nacional.
Íntegra da entrevista de Humberto Costa
Por que o senhor assegura em pronunciamento na tribuna do plenário do Senado que o parecer aprovado pelo TCU por unanimidade é apenas uma opinião?
Porque é isso que é. Na verdade, o Tribunal de Contas da União é um órgão de apoio, é um órgão de auxílio ao Poder Legislativo e aquilo que ele emite um parecer, é uma opinião. Eu lembro, por exemplo, que muitas e muitas vezes o Tribunal de Contas determinou que determinadas obras deveriam ser suspensas por considerar que havia algum tipo de suspeita de superfaturamento e o Congresso Nacional, no momento de avaliar o orçamento, teve uma posição diferenciada. Então, é uma opinião, é um parecer que vai ser levado em consideração, mas que não obriga o Congresso Nacional a aceitá-lo da forma com que chegou.
Líder, a oposição alega e repete que é uma decisão histórica, é uma decisão inusitada essa do TCU, e que isso condena de vez o governo Dilma Rousseff. O senhor acredita na possibilidade de o Congresso também ter uma posição inusitada em não seguir esse parecer?
Como eu já disse. Em vários momentos o Congresso Nacional teve entendimentos diferentes daquele que teve o Tribunal de Contas da União. Até porque o tribunal não é autônomo, ele não é integrante do Poder Judiciário e ele serve para ajudar o Poder Legislativo a tomar as suas posições no que diz respeito a temas relativos ao orçamento, a contas, a obras, enfim. Então, por essa razão, eu acredito que o Congresso Nacional pode sim, e deve ter uma opinião diferenciada dessa que foi apresentada.
A falta de quórum na Câmara dos Deputados para votar vetos da presidenta Dilma Rousseff não seria um mal sinal para a votação do parecer?
Veja. Esse parecer só vai ser objeto de apreciação do Congresso Nacional no ano que vem. Daqui a um bom tempo. Quatro, cinco meses. Em quatro, cinco meses, muitas coisas acontecem. Esse fato dos vetos no Congresso Nacional tem ainda a ver com negociações que estão sendo feitas com o governo. Não é nada que possa nos convencer de que há uma, digamos, efetivamente, uma posição firmada contra o governo.
O senhor disse que o tribunal não levou em conta argumentações técnicas feitas pelo governo. O senhor acredita que o Congresso Nacional pode levar em conta agora essas argumentações que o senhor diz que são técnicas também, que o TCU não aceitou?
Acredito que sim. Até porque o Congresso está inclusive votando contas de outros presidentes da República que tiveram, que incorreram nessas mesmas atitudes relativas a antecipação de recursos dos bancos pra pagamentos de programas sociais, decretos não numerados para abertura de crédito. Então, não vejo por que o Congresso não ter o mesmo peso e a mesma medida.
(Valdeci Rodrigues, especial para Política Real. Edição de Valdeci Rodrigues)