ESPECIAL DE FIM DE SEMANA: "Desigualdades sociais crescem desde o Império"
Tese é do historiador e pesquisador piauiense Chico Castro, referindo-se ao Nordeste em relação às regiões Sul e Sudeste
(Brasília-DF, 27/06/2014) O pesquisador e historiador piauiense Chico Castro afirma que as desigualdades regionais e sociais que separam o Nordeste do Sul e Sudeste do país só se ampliaram desde a proclamação da República em 15 de novembro de 1889. Ele defende a tese de que à época do Império, as políticas de promoção regional se davam de maneira mais igual do que ocorre atualmente.
“O Nordeste sempre perdeu. Com a República, quando se proclamou a República, em 15 de novembro de 1889, quem mais perdeu com isso foram os estados mais pobres. Então Piauí, Maranhão, Ceará, Alagoas, Sergipe, perderam muito porque na Monarquia, o poder, era centralizado com a Corte no Rio de Janeiro. Então as províncias dependiam do poder central. Eram agregados ao poder central”, falou Chico Castro com exclusividade para a reportagem da Política Real.
República do Café
O pesquisador Chico Castro entende que a transformação do Brasil de Monarquia para República beneficiou apenas os estados mais ricos da federação como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná. Mas, sobretudo São Paulo, principal produtor de café que, até então, era a maior riqueza nacional.
“Quando o Marechal Deodoro (da Fonseca) proclamou a República, ficou Estados Unidos do Brasil. E isso quer dizer o quê? Que os estados ficaram mais independentes com relação ao poder central. E isso foi bom para São Paulo, Rio, Minas, Rio Grande do Sul, Paraná. Mas para o Nordeste, não. Porque ao entregar maior autonomia aos estados, a República deixou os estados pobres, mais pobres ainda”, acrescentou.
Exemplo
“Logo após a proclamação da República, o Piauí quase foi anexado ao Ceará, porque não tinha condições de manter a máquina do governo, manter as escolas, os hospitais. Não tinha como. Como ele ia manter a sua economia, que antes na Monarquia era centralizada, passou a ser uma economia descentralizada. Porque a República passou a ser dos Estados Unidos do Brasil”, repetiu.
Modelo centralizador
Entretanto, Chico Castro garante que a adoção de uma política econômica centralizadora nas mãos do poder central, ou de uma política socioeconômica mais descentralizadora nas mãos de estados, não significa que os estados mais pobres conseguirão se desenvolver mais ou menos. Ele entende que é preciso políticas públicas com mais benefícios para estados menos desenvolvidos.
“Essa coisa mudou para República federativa depois de 1964. É porque as pessoas confundem tudo. Antes de 64, era República dos Estados Unidos do Brasil. Isso é uma coisa. Depois de 64 passou a ser República Federativa do Brasil. E isso quer dizer o quê? Na República dos Estados Unidos do Brasil, os estados eram mais independentes. Com a implantação da República Federativa, voltou de novo Brasília ser o centro do poder”, complementou.
Não é o ideal
O pesquisador piauiense entende também que a adoção de uma política mais centralizadora não resolve os problemas. “Hoje os estados brasileiros são pedintes. Vêm a Brasília para pedir dinheiro para os estados. Porque é República Federativa do Brasil em que o bolo das receitas brasileiras em sua maioria fica com a União”, completou.
“Pode ver que hoje a maior disputa no Brasil é esse sobre o pacto federativo. Ele (pacto federativo) é falho porque de todos os impostos que os brasileiros pagam, o governo federal fica com 55%. 25% ficam para os estados e 15% para os municípios. A República Federativa do Brasil voltou a ser semelhante ao tempo da Monarquia, quando a Monarquia centralizava todas as ações na Corte do Rio de Janeiro”, comentou.
Reflexos no Nordeste
Chico Castro mostra que, com a adoção em 1964 da República Federativa do Brasil, o Nordeste voltou a perder novamente. Ele acredita que a saída de um modelo descentralizador como foi entre 1889 e 1964, para entrar numa nova época centralizadora a partir do golpe militar, aumentou as desigualdades regionais entre o centro-sul mais desenvolvido para o centro-norte menos desenvolvido.
“E aí acontece o quê? O Nordeste, mais uma vez, perdeu. Por quê? Porque com este pacto federativo, os estados mais ricos ficaram mais ricos como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Porque este pacto federativo beneficiou mais uma vez os estados mais ricos. Pode-se observar que, inclusive, no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi um governo incrível para o Nordeste. Porque, neste sentido, não privilegiou, não pactuou a federação”, analisou.
Pacto nivelador
Chico Castro lamenta, ainda, que o tema das reformas que alterarão o atual pacto federativo não seja debatido de maneira séria pelo Congresso Nacional. “O Brasil é um país que o pacto federativo nunca foi discutido no Congresso. Nunca foi levado a sério. Tem a questão do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) brasileiro que é igual para todos. Quando existem estados diferenciados na economia”, afirma.
“Não se pode comparar São Paulo com o Piauí. Minas Gerais com Alagoas. Rio Grande do Sul com o Acre. É um pacto nivelador que não respeita as diferenças regionais. Este pacto federativo atual é o que provoca estas desigualdades. No sistema político brasileiro este pacto federativo não beneficia os estados mais pobres da federação. Como está no sistema, o Piauí vai ficar sempre como está, enquanto que São Paulo cresce absurdamente. Este pacto federativo não privilegia as diferenças regionais. Então historicamente falando, o Brasil não mudou praticamente nada”, finalizou.
(Por Humberto Azevedo, especial para Agência Política Real, com edição de Valdeci Rodrigues)