31 de julho de 2025
Nordeste e Desenvolvimento

ESPECIAL DE FIM DE SEMANA – Walter Pinheiro defende que, mesmo na crise do Ajuste Fiscal, o desenvolvimento regional é possível

Pinheiro não desiste da luta para manter contrato com eletrointensivas do Nordeste

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(Brasília-DF, 09/05/2015) No começo de 2015, a presidenta Dilma Rousseff apresentou sanção parcial ao projeto  que trata da indústria eletrointensiva e a prévia  renovação do contrato até 2042, agora senadores e deputados tentam evitar o vencimento do acordo em junho deste ano. Walter Pinheiro é um os mais envolvidos no assunto e tem constantemente reforçado sua luta pelo Nordeste.  Numa longa fala, exclusiva à Política Real, ele defende o setor, além de falar que é possível trabalhar desenvolvimento regional em época de crise econômica e Ajuste Fiscal.

 

No dia 28 de abril, Walter Pinheiro participou do seminário “Energia Competitiva do Nordeste”, realizado na sede da Federação das Indústrias da Bahia (Fieb). Na ocasião, o parlamentar ressaltou a importância do contrato com as eletrointensivas para a economia nacional e sua força para a exportação.

 

A Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), subsidiária da Eletrobras, fornece energia abaixo dos preços de mercado para as indústrias eletrointensivas com operação na Bahia, Alagoas e Pernambuco. Eletrointensivas são indústrias em que a energia elétrica tem grande impacto no processo de produção, como alumínio, papel, cimento e zinco.

 

O acordo inclui indústrias como Gerdau, Vale e Dow Química, que precisariam gastar três vezes mais com energia após o fim do acordo. A população sentirá os impactos diretos do fim deste contrato pelo aumento no valor das mercadorias produzidas por tais indústrias, e pior ainda, pelo desemprego caso as empresas não tenham condições de permanecer no Nordeste. A questão da energia barata para alguns setores não foi abandonada por Pinheiro e outros setores do Congresso, que inseriram o tema em várias medidas provisórias em trânsito no Congresso Nacional, como a MP 671/15 que trata de incentivos ao futebol.  O Ministério das Minas e Energia busca uma alternativa para a discussão, em sintonia com o Ministério da Fazenda, neste momento de tour de force pelo Ajuste Fiscal.

 

O senador baiano é um dos mais respeitados membros da bancada petista - famoso pela formação desenvolvimentista. Ele foi líder do PT no Senado ainda no segundo ano da Presidenta Dilma Rousseff, com ligações profundas com o setor de telecomunicações - é um petista com origem no sindicalismo, cada vez menos comum no Congresso Nacional. Pinheiro foi secretário de Planejamento da Bahia no Governo Jaques Wagner e tem uma uma visão mais ampla do novo perfil de desenvolvimento que se montou no Nordeste nos últimos anos.  Ele se voltou para a pauta federativa e colaborou para o assunto ficar em alta no Congresso Nacional nos últimos anos e fez com que o desgastante busca por uma reforma tributária ganhasse outro rumo.

 

Veja a íntegra da entrevista dada à Política Real :

 

Política Real:  A questão federativa voltou com força total no Congresso Nacional. Tem comissão sobre Pacto Federativo na Câmara, e no Senado o senhor se identificou com essa pauta. Não se fala mais em Reforma Tributária, mas em Reforma Federativa. Qual sua avaliação sobre esse novo rumo?

 

Walter Pinheiro: A gente começou uma Pauta Federativa aqui em 2011 que era decisiva, inclusive, para o Nordeste. Alguns elementos importantíssimos como o ICMS, a questão do comércio eletrônico, o projeto das dívidas dos estados, que em seu nascedouro tinha partes importantes que atendiam o desejo um pouco da própria estruturação dos estados e municípios do Nordeste e que agora foi modificada com a introdução da questão dos depósitos judiciais. Ao mesmo tempo, outra questão fundamental, que é o passo que a gente espera que o Congresso Nacional e particularmente o Senado vá adiante que é a questão da unificação do ICMS com a necessária chegada dos fundos. Tanto o desenvolvimento econômico quanto o fundo de compensação de perdas, principalmente nessa hora em que o Nordeste enfrenta as piores dificuldades dos últimos dez anos. Essa é uma política que resgataria a atividade econômica e de certa forma organizaria as finanças, principalmente de estados e municípios. No Nordeste, a presença mais forte é dos estados, municípios menos.

 

A capital Salvador, por exemplo, é uma capital onde a renda per capita é muito baixa, é uma cidade pobre. Salvador é campeã de desemprego no Nordeste e é uma cidade cuja atividade econômica passa por muita dificuldade, portanto o Pacto Federativo é fundamental para redistribuir esses recursos. É preciso tirar o pires da mão de estados e municípios e retomar a possibilidade efetiva de desenvolvimento econômico para o Nordeste.

 

Política Real - Os governadores do Nordeste apresentaram uma pauta dos interesses da região na Câmara e consequentemente para o Congresso. Em momento de crise econômica, é possível se falar de desenvolvimento regional? Isso não era para ter sido feito na época do crescimento econômico?

 

Walter Pinheiro :   Não. Na época da crise é onde tem que aprimorar a engenharia. Esse é um momento decisivo. Nós abrimos esse debate com os governadores ainda em 2011. Recebemos os governadores do Nordeste aqui no Senado agora em 2015 fazendo ver que a questão central é principalmente trabalhar o desenvolvimento regional com a expectativa do crescimento econômico. Não tem como mexer no INSS, por exemplo, se não houver uma política de desenvolvimento econômico. Não tem como estimular a unificação do ICMS pra substituir a guerra fiscal. A guerra fiscal mantida num período de crise é muito difícil pro governo. Que atrativos os governos do Nordeste puderam apresentar num momento de crise para que empresas se instalassem no Nordeste? Se não tiver um fundo de investimento que supere isso, vai ser muito difícil com recursos próprios e, portanto, mexendo já na combalida receita, que estados do Nordeste venham apresentar uma alternativa. É fundamental nessa hora de crise uma política de desenvolvimento patrocinada a partir dessa estrutura do Pacto Federativo.

 

É a única saída para retomar o crescimento, mexer na região, promover o processo de troca entre as regiões, permitindo ao Nordeste não só se relacionar para dentro, mas se relacionar para fora. Quando eu falo para fora, eu falo em dois sentidos: tanto com as outras regiões, quanto também aproveitar esse momento de dólar alto para preparar nossas empresas no Nordeste para que elas se tornem as principais exportadoras. Nós temos indústrias no Nordeste que hoje são modelos mundiais. São indústrias já preparadas, que já fazem o jogo internacional, que já disputam esse mercado e que precisariam fortemente de um incentivo para ir ao encontro de uma política que interessa ao governo federal nesse momento, que á política de exportação.

 

Política Real -  O senhor foi secretário de Planejamento na Bahia e tem uma pauta desenvolvimentista muito clara em seu mandato. Desde o ano passado, o senhor está envolvido com discussão sobre a manutenção de benefício fiscais para oferta de energia barata para certos setores. Como o Nordeste vai se manter crescendo com o encarecimento da energia em todos os setores? É possível, e como?

 

Walter Pinheiro : Tem duas coisas ai. Uma é a política de benefícios que de certa forma nós já aprovamos aqui no Senado o projeto dando garantia àquilo que foi acordado. A condição é a mudança dessa política de benefícios ou a política de guerra fiscal. Uma mudança dessa não é feita sem transição e sem contar que a sua palavra dada será cumprida. Aqueles que tiveram os benefícios e o prazo estabelecidos, a esses o Nordeste não pode negar a continuidade dessa política. Isso iria exatamente romper um acordo e ao mesmo tempo iria promover uma ruptura imediata quando a própria implantação de um novo sistema vai requerer um período, até debatido aqui no Congresso Nacional, de oito anos. O que nós fizemos com a política de benefício foi trabalhar a manutenção dos contratos e, portanto, qualquer modificação dar-se-ia daqui pra frente.

 

A outra questão é essa questão da energia, que tem dois componentes. Um é o componente dos processos hidrológicos e até o chamado atraso para entrada das fontes alternativas por diversos fatores, sejam eles licenças, sejam eles processos oriundos da ausência de linha de transmissão, ou de atraso de obra. Esses dois fatores determinaram problemas sérios no custo da energia. A energia ofertada hoje para a indústria no Nordeste tem o custo extremamente alto. O Nordeste tem hoje, as indústrias chamadas eletrointensivas que carecem dessa energia, mas estão prontas para exportação e não precisariam de nenhum tipo de modificação estrutural tão profunda nem de inovação. Esses atores estão no mercado precisando dessa política. O que não dá é para pagar o custo da energia extremamente elevado para disputar um mercado lá fora com gigantes. Essa não é uma disputa que se dá com amador, é uma disputa que se dá com grandes empresas nessa área. Outro aspecto é a renovação dos contratos. Além da crise energética, além do preço, essa indústria tem um contrato que vence agora em junho. Era fundamental que o governo num tempo razoável pudesse sinalizar o que faria, e não efetivamente a 30 dias do vencimento desses contratos. A gente ainda não sabe o que vai ser feito. Imagine para uma indústria eletrointensiva desmontar sua planta da noite para o dia ou perder a alimentação de energia e funcionamento.

 

Ninguém desliga um forno e religa como quem está ligando um forninho de esquentar pão. Um forno desses quando para, precisa de um processo extremamente delicado, duradouro e às vezes até impossível para voltar. A renovação de um contrato desse não poderia se permitir a um estrangulamento de trinta dias. Para que as pessoas tenham idéia de como no setor elétrico, no setor de energia, as coisas são em longo prazo: o Leilão A-5, por exemplo, quando chama as empresas para compra de energia, esse “-5” é o tempo, são cinco anos. Esses contratos foram feitos para vinte anos. Então, deixar para renovar um contrato faltando vinte dias para vencer é extremamente incongruente, ou, até diria, é uma política de morte anunciada. Se não tiver energia e se a decisão for não renovar, o que nós vamos fazer? Nós vamos parar essa atividade ou essas empresas vão comprar energia no mercado a um preço completamente desproporcional ao que existe em disputa no mercado internacional. A tendência natural é que essas empresas desempreguem, reduzam sua capacidade de produção e entrem num processo que só vai agravar mais ainda a situação em que o Nordeste se encontra.

 

Política Real -  E qual o senhor acha que seria a consequência do fim desse contrato para o Nordeste, principalmente para a Bahia?

 

Walter Pinheiro: Pra gente é o caos, por que vão fechar postos de trabalho num estado onde eu já tenho problemas seríssimos com estaleiro. A Bahia, de fevereiro pra cá começou a registrar números negativos na geração de postos de trabalho. Se esse contrato não for renovado, eu tenho vários prejuízos. O primeiro deles, de imediato, é exatamente a eliminação da mão de obra, conseqüentemente postos de trabalho. Uma questão que tem uma incidência direta é na economia. O estado deixa de arrecadar por conta da paralisação dessas atividades e esse estado deixa de investir e o dinheiro deixa de circular na economia baiana. Então eu tenho problema nas contas públicas, no pagamento do estado para fornecedores e isso vai num processo de cadeia. Isso vai sair da indústria do eletrointensivo, vai chegar até no varejo, vai chegar no serviço e vai chegar dentro de casa. Portanto, isso pode criar uma situação completamente incontrolável por parte do governo da Bahia, que já enfrenta problema de queda na sua arrecadação e problemas sérios para honrar seus compromissos. Não é uma queda de braço entre governo e eletrointensivo, é, na realidade, mexer na economia da Bahia e consequentemente na economia do Nordeste.

 

 

Política Real - A Bahia foi um dos estados que mais cresceu e desenvolveu nos melhores anos de Lula-Dilma. Qual a Bahia que o senhor mira até o final da década?

 

A minha expectativa é que a gente retome esse patamar de crescimento. Nós apostamos em duas grandes frentes na Bahia nos últimos anos: essa questão da geração de fontes alternativas de energia e o próprio setor mineral. Aliado a isso, nós buscamos uma política permanente de atração de empresas de tecnologia para a Bahia. Inauguramos um pacto ecológico, avançamos muito nessa área, levamos para a Bahia o super computador, que é o maior da América Latina e vai ser inaugurado dia 27 de maio. Implantamos um centro de pesquisa que é o Cimatec, que é talvez hoje o terceiro do país, apostamos no crescimento da indústria. Desconcentramos a economia da região da capital, abrimos frentes no interior do estado, tanto na energia eólica, no setor mineral, mas principalmente mexendo na estrutura de logística com a obra da ferrovia, na expectativa da chegada do novo porto, o Porto Sul. Enfim, abrimos frentes na economia com outras atividades, potencializamos a economia do campo. Portanto, minha expectativa é que essa crise que a gente está vivendo agora tanto do ponto de vista da redução dos investimentos do governo federal como também da própria questão da energia, a gente tenha condição de recuperar isso imediatamente para a Bahia voltar a crescer no patamar que ela vinha crescendo, inclusive mais do que o Brasil, como um elemento capaz de ajudar o Nordeste a retomar sua política de crescimento.

 

( da redação com texto de Mariana Lima e edição de Genésio Araújo Jr)