31 de julho de 2025
ENERGIA

OPINIÃO: Renovação das concessões de distribuição: oportunidade para alinhar o Brasil à nova era da eletrificação

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Por Jean Paul Prates, editado por Politica Real
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Jean Paul Prates em momento de fala, mas, hoje, em momento de opinião Foto: Arquivo da Política Real

Por Jean Paul Prates, Mestre em Política Energética e Gestão Ambiental pela Universidade da Pensilvânia.

A renovação das concessões de distribuição de energia elétrica que vencem nos próximos anos, regulamentada pelo Decreto nº 12.068/2024, representa uma das decisões mais estratégicas da política energética nacional neste início de década. Não se trata apenas de definir a continuidade de contratos ou a estabilidade regulatória. Está em jogo a capacidade de preparar o Brasil para a nova era da eletrificação, marcada pela digitalização, pela mobilidade elétrica, pela geração distribuída e pela crescente integração entre infraestrutura energética e serviços urbanos.

Historicamente, a distribuição foi tratada como o “elo passivo” da cadeia elétrica, responsável pela entrega do insumo ao consumidor final e limitada a metas de universalização e indicadores básicos de qualidade. Esse paradigma não responde mais às demandas do século XXI. As redes de distribuição estão se tornando o ponto de convergência entre geração centralizada e descentralizada, consumidores e prosumidores, energia e dados. Portanto, a renovação das concessões não pode se restringir a um mero checklist burocrático, mas deve ser utilizada como instrumento de modernização estrutural do setor.

O momento é oportuno para corrigir falhas históricas e impor novas condições contratuais condizentes com os desafios atuais. Entre elas, destacam-se:

Integração com a geração distribuída: assegurar que as redes estejam aptas a incorporar de forma eficiente a produção local de energia solar, eólica e outras fontes descentralizadas, reduzindo perdas, incentivando modelos inovadores de agregação e propiciando controle digital individualizado quanto ao despacho da energia para o sistema.

Infraestrutura para a eletromobilidade: incluir cláusulas que estimulem investimentos em redes preparadas para o carregamento veicular, em sinergia com planos de mobilidade urbana.

Acondicionamento paisagístico e urbanístico: priorizar o enterramento seletivo de linhas aéreas em áreas críticas, turísticas ou de relevância histórica, conciliando segurança elétrica com valorização urbana.

Novos modelos de negócio: permitir que as distribuidoras explorem serviços complementares, como redes de fibra ótica, conectividade digital, soluções de gestão da demanda e até parcerias em serviços urbanos inteligentes.

Remuneração condigna dos investimentos: alinhar a regulação à necessidade de atrair capital de longo prazo, reconhecendo que a eletrificação das economias exigirá um ciclo robusto e contínuo de investimentos na rede.

O Brasil, ao renovar suas concessões de distribuição, deve escolher entre duas trajetórias: manter a lógica de continuidade, perpetuando um modelo limitado ao fornecimento básico de energia; ou assumir a dianteira de uma transformação que conecte a distribuição elétrica ao futuro da eletrificação e da economia digital.

É essencial que reguladores, governo e sociedade não desperdicem esta oportunidade. A prorrogação das concessões deve ser condicionada não apenas ao cumprimento de obrigações pretéritas, mas, sobretudo, à assunção de compromissos inovadores que posicionem o país como líder em redes inteligentes, integração urbano-energética e resiliência climática.

Trata-se de uma chance rara, talvez única, de redefinir o papel da distribuição no sistema elétrico nacional e de alinhar o Brasil às tendências globais. Ignorar esse momento seria abrir mão de ganhos em competitividade, qualidade de vida urbana e segurança energética.

Jean Paul Prates é Mestre em Política Energética e Gestão Ambiental pela Universidade da Pensilvânia e Mestre em Economia da Energia pelo IFP School (Paris). Foi presidente da Petrobrás (2023–2024) e Senador da República (2019–2023).