Ata Copom fala da preocupação com o tarifaço e que a inflação pode ser impactada pelas pressões do mercado de trabalho, que está positivo
Veja a íntegra da Ata do Copom
Publicado em
(Brasília-DF, 05/08/2025). Nesta manhã, 05, o Banco Central divulgou a Ata do Copom da reunião da semana passada, como já era esperado para esta terça-feira.
O documento com 26 itens revela votação unânime em que é dito, entre outras coisas, que ainda existe pressão elevada face a melhora do mercado de trabalho e o tarifaço.
“O Comitê tem acompanhado, com particular atenção, os anúncios referentes à imposição pelos EUA de tarifas comerciais ao Brasil, reforçando a postura de cautela em cenário de maior incerteza. Além disso, segue acompanhando como os desenvolvimentos da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. O cenário segue sendo marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho.”, disse
Veja:
Atas do Comitê de Política Monetária - Copom
272ª Reunião - 29-30 julho, 2025
A) Atualização da conjuntura econômica e do cenário do Copom1
1. O ambiente externo está mais adverso e incerto em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos, principalmente acerca de suas políticas comercial e fiscal e de seus respectivos efeitos.
2. Consequentemente, o comportamento e a volatilidade de diferentes classes de ativos têm sido afetados, com reflexos nas condições financeiras globais. Tal cenário exige particular cautela por parte de países emergentes em ambiente marcado por tensão geopolítica.
3. Em relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores de atividade econômica tem apresentado, conforme esperado, certa moderação no crescimento, mas o mercado de trabalho ainda mostra dinamismo.
4. Nas divulgações mais recentes, a inflação cheia e as medidas subjacentes mantiveram-se acima da meta para a inflação. As expectativas de inflação para 2025 e 2026 apuradas pela pesquisa Focus permanecem em valores acima da meta, situando-se em 5,1% e 4,4%, respectivamente.
B) Cenários e análise de riscos
5. O cenário prospectivo de inflação segue desafiador em diversas dimensões. O Comitê analisou o cenário internacional, a atividade econômica, a demanda agregada, as expectativas de inflação e a inflação corrente. Em seguida, discutiu as projeções e expectativas de inflação para então deliberar sobre a decisão corrente e comunicação futura.
6. O cenário externo está mais adverso e incerto. Se, de um lado, a aprovação de alguns acordos comerciais, assim como os dados recentes de inflação e atividade da economia norte-americana poderiam sugerir uma situação de redução da incerteza global, de outro, a política fiscal e, em particular para o Brasil, a política comercial norte-americanas tornam o cenário mais incerto e mais adverso. A elevação por parte dos Estados Unidos das tarifas comerciais para o Brasil tem impactos setoriais relevantes e impactos agregados ainda incertos a depender de como se encaminharão os próximos passos da negociação e a percepção de risco inerente ao processo. O Comitê acompanha com atenção os possíveis impactos sobre a economia real e sobre os ativos financeiros. A avaliação predominante no Comitê é de que há maior incerteza no cenário externo e, consequentemente, o Copom deve preservar uma postura de cautela. Como usual, o Comitê focará nos mecanismos de transmissão da conjuntura externa sobre a dinâmica de inflação interna e seu impacto sobre o cenário prospectivo.
7. A conjuntura de atividade econômica doméstica tem indicado certa moderação no crescimento e, ao mesmo tempo, apresentado dados mistos entre os setores e indicadores.
8. De modo geral, observa-se uma certa moderação de crescimento, corroborando o cenário delineado pelo Comitê. Tal moderação, necessária para a abertura de hiato e a convergência da inflação à meta, se coaduna com uma política monetária contracionista. As pesquisas setoriais mensais e os dados mais tempestivos de consumo corroboram uma redução gradual de crescimento.
9. Em momentos de inflexão no ciclo econômico, é natural que se observem sinais mistos advindos de indicadores econômicos, alguns antecedentes, outros defasados, como também de comparações entre mercados, por exemplo, os mercados de crédito e de trabalho.
10. O mercado de crédito, mais sensível às condições financeiras, tem apresentado uma moderação mais nítida. Observa-se um recuo nas concessões de crédito livre e elevação nas taxas de juros e de inadimplência. Além disso, no crédito às pessoas físicas, há um aumento do comprometimento da renda familiar com o serviço das dívidas e um aprofundamento do fluxo de crédito negativo, ou seja, maior pagamento do que contratação de dívida por parte das pessoas físicas. Ressaltou-se, no debate, que algumas medidas recentes, como o consignado privado, têm tido menor impacto do que era esperado por muitos participantes do mercado. Tendo em vista o calendário de implementação nesta linha de crédito, bem como o efeito em outras modalidades da introdução e retirada de impostos, o Comitê avalia que deve acompanhar atentamente as próximas divulgações dos dados de crédito.
11. Em contraposição ao mercado de crédito, o mercado de trabalho segue dinâmico. Tanto do ponto de vista de renda, com ganhos reais consistentemente acima da produtividade, como do emprego, com redução expressiva da taxa de desemprego para níveis historicamente baixos, o mercado de trabalho tem dado bastante suporte ao consumo e à renda.
12. Desse modo, o Comitê avalia que os sinais advindos da demanda e da atividade econômica até aqui sugerem que o cenário se desenrola conforme esperado e compatível com a política monetária em curso. O Comitê reforça que o arrefecimento da demanda agregada é um elemento essencial do processo de reequilíbrio entre oferta e demanda da economia e convergência da inflação à meta.
13. A política fiscal tem um impacto de curto prazo, majoritariamente por meio de estímulo à demanda agregada, e uma dimensão mais estrutural, que tem potencial de afetar a percepção sobre a sustentabilidade da dívida e impactar o prêmio a termo da curva de juros. Uma política fiscal que atue de forma contracíclica e contribua para a redução do prêmio de risco favorece a convergência da inflação à meta. O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade. O Comitê manteve a firme convicção de que as políticas devem ser previsíveis, críveis e anticíclicas. Em particular, o debate do Comitê evidenciou, novamente, a necessidade de políticas fiscal e monetária harmoniosas.
14. As expectativas de inflação, medidas por diferentes instrumentos e obtidas de diferentes grupos de agentes, mantiveram-se acima da meta de inflação em todos os horizontes, mantendo o cenário de inflação adverso. Nos horizontes mais curtos, a partir da divulgação dos dados mais recentes, observou-se uma queda nas expectativas de inflação. Para os horizontes mais longos, por outro lado, não houve alteração relevante entre as reuniões do Copom nas expectativas de inflação, ainda que as medidas de inflação implícita extraídas de ativos financeiros tenham se reduzido. O Comitê reforçou e renovou seu compromisso com a reancoragem das expectativas e com a condução de uma política monetária que enseje tal movimento.
15. A desancoragem das expectativas de inflação é um fator de desconforto comum a todos os membros do Comitê e deve ser combatida. Foi ressaltado que ambientes com expectativas desancoradas aumentam o custo de desinflação em termos de atividade. O cenário de convergência da inflação à meta torna-se mais desafiador com expectativas desancoradas para prazos mais longos. Na discussão sobre esse tema, a principal conclusão obtida e compartilhada por todos os membros do Comitê foi de que, em um ambiente de expectativas desancoradas, como é o caso do atual, exige-se uma restrição monetária maior e por mais tempo do que outrora seria apropriado.
16. O cenário de inflação seguiu apresentando surpresas baixistas no período recente em relação ao que os analistas previam, mas manteve-se com inflação acima da meta. A inflação de bens industrializados, que já vem mostrando menor força nos preços ao atacado, continuou a se arrefecer no período mais recente. Os preços de alimentos também apresentaram uma dinâmica um pouco mais fraca do que era esperado. Por fim, a inflação de serviços, que tem maior inércia, segue acima do nível compatível com o cumprimento da meta, em contexto de hiato positivo. Para além das variações dos itens, ou mesmo das oscilações de curto prazo, os núcleos de inflação têm se mantido acima do valor compatível com o atingimento da meta há meses, corroborando a interpretação de uma inflação pressionada pela demanda e que requer uma política monetária contracionista por um período bastante prolongado.
17. O Comitê se debruçou então sobre as projeções. No cenário de referência, a trajetória para a taxa de juros é extraída da pesquisa Focus e a taxa de câmbio parte de R$5,55/US$2, evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC). O preço do petróleo segue aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses e passa a aumentar 2% ao ano posteriormente. Além disso, adota-se a hipótese de bandeira tarifária “verde” em dezembro de 2025 e de 2026.
18. No cenário de referência, as projeções para a inflação acumulada em quatro trimestres para 2025 e para 2026, são, respectivamente, 4,9% e 3,6% (Tabela 1). Para o horizonte relevante de política monetária, primeiro trimestre de 2027, a projeção de inflação utilizando o cenário de referência extraído da pesquisa Focus se manteve acima da meta de inflação, em 3,4%.
19. Com relação ao balanço de riscos, avaliou-se que o cenário de maior incerteza segue apresentando riscos mais elevados do que o usual tanto de alta quanto de baixa para o cenário de inflação. O Comitê avaliou que, entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma desancoragem das expectativas de inflação por período mais prolongado; (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais positivo; e (iii) uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário maior que o esperado, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma eventual desaceleração da atividade econômica doméstica mais acentuada do que a projetada, tendo impactos sobre o cenário de inflação; (ii) uma desaceleração global mais pronunciada decorrente do choque de comércio e de um cenário de maior incerteza; e (iii) uma redução nos preços das commodities com efeitos desinflacionários.
20. Prospectivamente, o Comitê seguirá acompanhando o ritmo da atividade econômica, fundamental na determinação da inflação, em particular da inflação de serviços; o repasse do câmbio para a inflação, após um processo de maior volatilidade da taxa de câmbio; e as expectativas de inflação, que se mantêm desancoradas e são determinantes para o comportamento da inflação futura. Enfatizou-se que os vetores inflacionários seguem adversos, como resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho, expectativas de inflação desancoradas e projeções de inflação elevadas. Tal cenário prescreve uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período bastante prolongado para assegurar a convergência da inflação à meta.
C) Discussão sobre a condução da política monetária
21. O Copom passou então à discussão da condução da política monetária, considerando o conjunto de projeções analisado, assim como o balanço de riscos para a inflação prospectiva.
22. O Comitê avalia que, após um ciclo rápido e firme de elevação de juros, antecipa-se, como estratégia de condução de política monetária, continuar a interrupção do ciclo de alta para observar os efeitos do ciclo empreendido. Ressaltou-se que, determinada a taxa apropriada de juros, ela deve permanecer em patamar significativamente contracionista por período bastante prolongado devido às expectativas desancoradas. O Comitê enfatiza que seguirá vigilante, que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e que não hesitará em prosseguir no ciclo de ajuste caso julgue apropriado.
D) Decisão de política monetária
23. O Comitê tem acompanhado, com particular atenção, os anúncios referentes à imposição pelos EUA de tarifas comerciais ao Brasil, reforçando a postura de cautela em cenário de maior incerteza. Além disso, segue acompanhando como os desenvolvimentos da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros. O cenário segue sendo marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho. Para assegurar a convergência da inflação à meta em ambiente de expectativas desancoradas, exige-se uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período bastante prolongado.
24. O Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 15,00% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
25. O cenário atual, marcado por elevada incerteza, exige cautela na condução da política monetária. Em se confirmando o cenário esperado, o Comitê antecipa uma continuação na interrupção no ciclo de alta de juros para examinar os impactos acumulados do ajuste já realizado, ainda por serem observados, e então avaliar se o nível corrente da taxa de juros, considerando a sua manutenção por período bastante prolongado, é suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta. O Comitê enfatiza que seguirá vigilante, que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso julgue apropriado.
26. Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Gabriel Muricca Galípolo (presidente), Ailton de Aquino Santos, Diogo Abry Guillen, Gilneu Francisco Astolfi Vivan, Izabela Moreira Correa, Nilton José Schneider David, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo Alves Teixeira.
( da redação com informações de assessoria. Edição: Política Real)