Nordeste e Poder

ESPECIAL DE FIM DE SEMANA – A “salvação” para o colapso hídrico do Nordeste pode vir do Norte

Trabalho sobre a Transposição do Rio São Francisco terá prosseguimento em 2016, ano de eleição, e deputados apostam na dinâmica e avanço nas obras

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(Brasília-DF, 11/12/2015) “O sertão vai virar mar/Dá no coração/O medo que algum dia/o mar também vire sertão”. Não foi ainda desta vez, em 2015, que a profecia cantada na música “Sobradinho”, de Sá e Guarabira, se concretizou. Como não foi este ano que o governo federal conseguiu avançar nas obras da transposição do rio São Francisco, um dos importantes do Brasil.

Também não foi nesta legislatura que os deputados conseguiram algo concreto do governo federal, no que diz respeito à celeridade dos trabalhos de construção dos canais, barragens e adutoras e quanto às inciativas/programas para o iminente risco de colapso hídrico que a região do Nordeste vive.

De positivo nessa história é a insistência dos deputados em não deixar o “tema morrer”. Através de uma Comissão Externa, criada pela Presidência da Câmara em março, eles trouxeram à tona irregularidades nas obras, criticaram a morosidade e a falta de sintonia entre os órgãos governamentais (com dados e atribuições divergentes), alertaram para o escassez de água na região e chamaram a atenção do País para a questão ambiental da obra – o esgotamento sanitário, preservação da mata ciliar e revitalização do para o “Velho Chico” e outros rios na rota da transposição.

E encerram o ano com boas notícias: a prorrogação dos trabalhos do colegiado para 2016 – que deve começar visitando a Barragem de Sobradinho e o Complexo Hidrelétrico de Paulo Afonso, ambos na Bahia -, e a apresentação de uma emenda ao Orçamento da União que pode viabilizar a transposição de águas do rio Tocantins. É o que revela o presidente da Comissão Externa da Transposição Rio São Francisco, Raimundo Gomes de Matos (PSDB-CE), nesta entrevista concedida ao jornalista Gil Maranhão da Agência Política Real.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - Qual a avaliação que o senhor faz dos trabalhos da Comissão? Em que avançou?

 

Foi importante porque nós ouvimos secretários estaduais do Meio Ambiente, os órgãos envolvidos neste grande projeto como os ministérios de Minas e Energias, da Integração, do Meio Ambiente, do  Desenvolvimento, e assim podermos debater  e acelerar essas obras. Há um atraso bastante significativo. Pelo volume de recursos deliberados, cerca de R$ 8 bilhões, era para essa obra estar concluída. No entanto, houve vários atrasos. O Tribunal de Contas da União (TCU) também apresentou que houve uma economia de quase R$ 500 milhões, porque foi detectado preços elevados, mas infelizmente não virou uma “Operação Lava Jato”, pois tiveram que refazer as planilhas. Estamos encerrando o ano com otimismo.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - A Comissão fez várias visitas técnicas. O que foi constatado?

 

Fomos a vários estados: Paraíba, Minas Gerais, Ceará, Pernambuco, vendo as obras in loco. E vendo também o estado do rio São Francisco, a necessidade de revitalizarmos o rio. Está faltando água. Tudo isso gera essa instabilidade. Infelizmente, o governo fez muita ação e propaganda da engenharia do canal, da construção física, sem ver as demais estruturas, ao ponto que, se o canal hoje estivesse pronto, nós não teríamos água, porque a CHESF (Companhia Hidrelétrica do São Francisco) diz que se for liberar água vai faltar energia. Então, não houve um planejamento. Já era para ter sido feito, na região de Sobradinho, implantação de energia solar, energia eólica para jogar dentro da rede, e não gerar essa dificuldade.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - Outra questão que vocês viram e preocupou foi a do esgotamento sanitário.

 

É, tem também a questão do saneamento. Dos 339 municípios que serão beneficiados com a transposição foi previsto fazer o saneamento dessas cidades, senão os esgotos encostam na parede e através das infiltrações podem contaminar  a água (para consumo) dos canais. Tudo isso serviu para que a Comissão pudesse ouvir o Ministério das Cidades, Caixa Econômica, porque muitos projetos de saneamento e abastecimento de água foi via a Caixa, nos municípios e estado. Ouvimos também as agências que operam com a conservação e distribuição da água. Tudo isso nós constatamos.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - Foi apresentada uma proposta ao Orçamento da União para fazer a transposição do rio Tocantins para o São Francisco. Como será isso?

 

Apresentamos uma proposta ao Orçamento solicitando recursos não só para manter o ritmo das obras da transposição, como também foi aprovada uma emenda que apresentei ao Orçamento para alocar recursos para fazer a transposição Tocantins-São Francisco. Toda aquela margem do Tocantins tem um volume de água bastante elevado e que tem condições de ajudar, fazer a carga nos reservatórios da transposição do São Francisco. A Comissão de Orçamento aprovou, e nós vamos aprovar no Plenário da Câmara. Nós colocamos R$ 600 milhões, mas vai precisar de muito mais. Contudo, já fica na peça orçamentária a janela aberta e a demonstração do Congresso Nacional de que precisa, sim, fazer a transposição do Tocantins para o São Francisco. Nós nos mobilizamos e defendemos essa proposta e os deputados e senadores da Comissão de Orçamento acataram, porque viram que a partir desta nossa Comissão, tivemos conhecimento de tudo que estava acontecendo e que a vazão de água outorgada ela Agência Nacional de Água (ANA) não é suficiente para atender o Nordeste. Por isso que há essa sinalização. O passo seguinte será elaborar com os ministérios uma proposta de transpor às águas do Tocantins, lá no eixo com a Bahia, para cair dentro do riacho/do lago da transposição do São Francisco.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - Sabendo que 2016 é um ano de eleições, o senhor acredita que vai dar para o governo tocar essa obra, que estava, inclusive, prevista para ser entregue no próximo ano?

 

Eu acho difícil entregar tudo no próximo ano. Mas, uma parte sim. É ano de eleição, mas como é uma obra federal, não vai ter muito problema. As obras dos municípios, executadas pelos municípios, como a de saneamento e de abastecimento, estas, sim, se não correrem até o meio do ano, têm que esperar os resultados das eleições para darem prosseguimento. Agora, as obras dos canais, estações elevatórias, estações de bombeamento, como são obras federais, podem seguir seu rito normal, independente das eleições municipais.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - A Comissão vai fazer uma pressão ao governo para que esses recursos que vocês estão propondo no Orçamento da União sejam realmente efetivados?

 

Sem dúvida. É importante a população saber que a Comissão vai continuar essa mobilização a fim de termos efetivamente conclusos os trabalhos da transposição do rio Francisco em 2016.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - No próximo ano, além das visitas técnicas, a Comissão parece que quer encampar uma luta em defesa do DNOCS?

 

É. Já estão aprovados requerimentos para as visitas técnicas às barragens de Sobradinho e Paulo Afonso. E depois faremos uma visita à Adutora do Agreste, na região da Paraíba. Tudo isso para vermos o estágio, o andamento das obras. Mas temos uma luta, também, em favor da revitalização do DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas). Houve, este ano, uma audiência pública na Comissão da Agricultura para vermos como reestruturamos esse órgão, com recursos humanos, com estrutura para que possa ajudar no gerenciamento hídrico do Nordeste. É inconcebível esse órgão estar quase paralisado. A Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) não tem ainda estrutura suficiente para administrar a transposição. E isso foi também debatido na nossa comissão.

 

AGÊNCIA POLÍTICA REAL - E como vocês pretendem fortalecer esses órgãos do Nordeste?

 

Para fortalecer esses órgãos, o primeiro passo é derrubar, aqui no Congresso, essa matéria da presidente Dilma, de que no próximo ano não pode ter concurso nenhum. E derrubar, também, a proposta do governo de afastar os servidores que recebem o Abono Permanência, que são aqueles que já têm idade para se aposentar e recebem cerca de R$ 1.500,00 a R$ 2.000,00 para continuarem trabalhando. Se essas pessoas se afastarem, só no DNOCS serão cerca 800 funcionários que vão deixar o órgão. Então, nós precisamos, através da Bancada do Nordeste, ter essa força para evitar esse descaso que é feito em relação à nossa região.

 

(Por Gil Maranhão – Especial para Agência Política Real. Edição: Genésio Jr.)