ESPECIAL DE FIM DE SEMANA – Fernando Bezerra cobra olhar diferenciado para o Nordeste, sem contingenciamento para investimentos no setor hídrico
Em meio ao ajuste fiscal, a previsão para 2015 será de um ano duro para municípios e governadores, mas a saída passa pela equação política da crise
( Publicada originalmente às 15h 57 do dia 21/03/2015)
(Brasília-DF, 23/03/2015) O Nordeste é onde está o maior número de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza. Na medida em que a economia entra em retração, as regiões mais pobres são as regiões mais afetadas do ponto de vista social. O senador Fernando Bezerra (PSB-PE), está bastante preocupado com o impacto do ajuste fiscal para a Região Nordeste. Em entrevista exclusiva à Política Real ele fez uma análise da economia, dando alternativas para o Governo Dilma Rousseff não errar na dose das medidas econômicas mais uma vez.
Ele prevê um ano duro para a região Nordeste, e, claro para a economia como um todo do Brasil. Sabe muito bem, pela experiência em gestão pública, a importância de haver planejamento para pelo menos amenizar os efeitos do ajuste fiscal que irá apertar ainda mais o “cinto” da economia da Região Nordeste.
“Daí, portanto é importante que na hora de selecionar os projetos que serão priorizados que não se trate igualmente aquilo que é diferente. É importante que o governo tenha um olhar diferenciado para a Região Nordeste”, disse.
Sem contingenciamento
Nesta quinta-feira, 19, lembrando que neste domingo se comemora o dia mundial da água, Fernando Coelho falou da tribuna do Senado sobre a necessidade de não se contingenciar verbas para obras de recursos hídricos. “É urgente hoje no País é investimentos na área de recursos hídricos na construção de barragens, capacitação de água, ampliação da distribuição de água, para sistema de efetivação do uso de água”, ressaltou.
Esses investimentos não podem sofrer qualquer tipo de contingenciamento em função dos cortes que efetivamente virão para equilibrar as contas do governo federal. É importante que nessa perspectiva o Nordeste possa também sofrer menos do ponto de vista da área do investimento público.
Estados e municípios
Esse ano de 2015 será certamente muito duro para os municípios brasileiros. Fernando Bezerra cita o boletim Focus do Banco Central, que aponta refração da economia de 0,6% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.
Já os relatórios do chamado “mercado” apontam para um crescimento negativo superior a um ponto percentual. “Isso significa que vamos ter menos receita a serem partilhadas com estados e municípios. Consequentemente os municípios que já vivem dificuldades enormes para manter os serviços essenciais de educação, saúde e segurança, passarão a ter dificuldades até mesmo do custeio da máquina, de pagamento de pessoal”, projetou Fernando Bezerra.
Para melhorar
Fernando Bezerra avalia que, neste 2015 difícil a alternativa para melhorar a situação econômica é abrir um espaço na agenda do Congresso Nacional para discutir em profundidade o estabelecimento de um novo federalismo. E, claro, criando condições de uma partilha melhor da receita pública entre os entes federados.
União usurpadora
A União continua a ser usurpadora quando se fala em arrecadação e ao mesmo tempo distribuição de recursos. “Para se ter uma ideia quando nós colocamos os impostos e todas as contribuições de cada R$ 100,00 arrecadados no Brasil, R$ 63,00 ficam com o governo da União, R$ 25,00 ficam com os governos estaduais e apenas R$ 12,00 ficam com os municípios”, frisou Fernando Bezerra.
Ele defende uma rediscussão urgente quanto à partilha dos recursos públicos, de impostos e contribuições. Assim como discutir também a base de competência para que estados e municípios possam tributar. Acredito que eles possam ter condições de auferir maiores e melhores receitas. Essa é uma questão que não vai poder ser postergada em função da crise fiscal quer será muito mais aguda nos municípios e estados.
União gulosa
A diferença dos governos estaduais e municípios para a União é que ela pode sempre pode lançar títulos da dívida pública no mercado. Os estados não tem como fazer isso. E nas medidas de ajustes que são adotadas existem restrições ao financiamento público para investimentos de infraestrutura e também nos setores sociais.
Não se pode perder de vista que os municípios só vivem das transferências da União e dos impostos que são arrecadados regionalmente. Portanto, os municípios têm menos instrumentos para poder enfrentar períodos de dificuldade como se prevê para 2015 e 2016.
Reforma política
A agenda da reforma política está finalmente enfrentada com maior ênfase pelas forças políticas. Fernando Bezerra tem percepção de que a sociedade está insatisfeita, indignada com todos os episódios que vem-se acumulando.
Ao longo dos últimos anos a sociedade ficou perplexa com episódios envolvendo corrupção. Desvio de recursos para financiamento de campanha. “Não vamos poder fugir da agenda que vem sendo colocada como prioridade pelas manifestações que estão ocorrendo em todo o Brasil”, destacou.
Não ideal
O financiamento de campanha é elemento fundamental na reforma política. Ele admitiu que não existe uma reforma ideal pela dificuldade de se celebrar um consenso em relação a pontos da reforma. Hoje o Congresso Nacional é muito pulverizado, 28 partidos na Câmara, 16 partidos no Senado. E segundo, Fernando Bezerra, “por isso, é difícil gerar consensos e entendimentos”.
Apesar disso, para ele, alguns pontos deverão ter apoios suficientes para serem aprovados no bojo da reforma política. No caso do financiamento das campanhas, ele entende que a receptividade é grande para a modalidade de financiamento misto de recursos públicos e privados, com a ressalva de ser oriundo de pessoas físicas. “Essa é, inclusive, a proposta do meu partido, PSB”, observou.
O fim da reeleição é outro ponto em que há uma grande maioria favorável. Há possibilidade de significativa parcela dos parlamentares votar a coincidência dos mandatos e o fim das coligações proporcionais. Fernando Bezerra também defende a criação de cláusula de barreira para que os partidos possam ter um percentual mínimo de votos com a possibilidade de acessar os fundos partidários e o tempo de rádio de televisão.
“Parece que esses pontos encontraram aqui na Casa, apesar de não ser consenso, uma maioria suficiente para poder ser validados na reforma que se quer aprovar até setembro”, ressaltou.
Distritão, não
Já o voto denominado “Distritão”, é polêmico entre os parlamentares. Trata-se de uma modalidade em que seriam eleitos os candidatos mais votados nos estados e no Distrito Federal, não sendo divididos em distritos. Daí o nome “Distritão”. Seria semelhante ao voto majoritário, utilizado para cargos do Executivo e para o Senado, só que para deputados federais, estaduais e vereadores.
Na visão de Fernando Bezerra não é um bom elemento porque diminui o papel dos partidos. Valoriza-se o voto nas pessoas e não posição programática dos partidos. “Não deverá prosperar por nada o apoio do PMDB a essa tese”, disse.
Relação entre Governo e Congresso
Existe, hoje, esforço para recuperar o diálogo e a interlocução do Governo Federal com o Congresso Nacional, segundo Fernando Bezerra. E com prioridade para melhorar a relação com as forças políticas que dão sustentação ao governo no Congresso Nacional.
Fernando Bezerra entende que isso tudo é resultado dos erros cometidos após a vitória da eleição do segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff.
Na opinião de Fernando Bezerra, a presidenta Dilma Rousseff tinha dois caminhos. Governar com o resultado das eleições ou com o recado das eleições. O recado das eleições era muito claro. O Brasil estava dividido. Era preciso ter muito mais paciência, esforço, dedicação para não só ouvir as forças políticas, mas a sociedade.
Também estava evidente que o Brasil iria precisar de uma fase de ajustes em função do desequilíbrio das suas contas públicas. E o que se constatou foi que entre dezembro e janeiro, o governo não foi feliz na montagem da equipe de governo. Quando ocorreu uma séria de contrariedades em função das expectativas, por exemplo, do PMDB o Senado, em relação a sua presença na equipe ministerial.
Então o governo terminou fazendo a opção pela “política do enfrentamento”, nas disputas das Mesas Diretoras do Senado e na Câmara, lembrou ele.
Fernando Bezerra acrescentou que esse “enfrentamento” ficou mais evidente na Câmara, por conta da cristalização da luta entre o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) e o atual presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Naquele momento, o PSB tentou quebrar essa polarização com a candidatura de Julio Delgado (PSB-MG), por sinal, “muito bem votada”. Mas o fato é que no momento em que já se tinham todos os indicadores, indícios de que era preciso unir toda a sociedade, juntamente e a base congressual do governo nas duas Casas. “O governo escolheu o pior caminho, o do enfrentamento”, enfatizou.
Agora, na relação entre o Executivo e o Legislativo, na visão de Fernando Bezerra, o fato concreto é que continuam havendo episódios que não contribuem para que esse diálogo se consolide.
Fernando Bezerra se refere ao mais recente, que foi o enfrentamento a partir das ofensas do ex-ministro da Educação, Cid Gomes (PROS-CE), aos deputados, os qualificando de “achacadores”. Cid foi à tribuna da Câmara a pressão e o estresse culminou com a saída de Cid Gomes do governo, nessa semana, para muitos premeditadamente, quase que pedindo para sair do governo Dilma.
“Vamos torcer, porque é importante para enfrentar a crise econômica, enfrentar a crise política e a crise política pressupõe que o governo possa articular sua base para apoiar e fazer aprovar as medidas de ajuste fiscal”, considerou Fernando Bezerra.
Para ele, é a saída para gerar credibilidade e uma expectativa mais favorável de que é possível fazer no período entre 2015 e metade de 2016 uma “travessia na promoção dos ajustes para que depois se possa relançar o Brasil na trajetória do crescimento”.
Como já é mais do que público e notório, a contrapartida, ou a parcela de contribuição para o entendimento é a presidenta Dilma Rousseff dialogar mais com todos. Ouvindo muito mais seu ciclo de colaboradores, mais ainda com as forças vivas da sociedade.
(Por Maurício Nogueira, para Agência Política Real, com edição de Genésio Araújo Jr.)