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Jorge Henrique Cartaxo
  • 27/06/2019 16h04

    Tempo de fábulas

    Todos, a seu modo, vendem virtudes para entregar o inferno.

    O Nascimento de Venus ( Afrodite ) ( Foto: arquivo do colunista)

    “Nada é tão moderno em Shakespeare quanto os seus vilões. São sempre os únicos personagens lúcidos das suas peças, os únicos sem qualquer ilusão sobre a sua própria motivação e a dos outros...No maior de todos, Ricardo III, a vilania autoconsciente parece ainda mais moderna porque envolve também uma fria reflexão sobre o poder e ao que ele obriga”. 

    A observação de Luiz Fernando Verissimo, que abre sua crônica “Intelectual no Poder”, publicada no livro “Banquete com os Deuses – Cinema , literatura, música e outras artes / Editora Objetiva-2003”, nos remete, sem grandes rodeios, ao Brasil contemporâneo. É possível que sempre tenhamos sido assim: feios, sujos e malvados. “ ...eu, privado dessa bela proporção, desprovido de todo encanto pela pérfida natureza; disforme, inacabado, enviado por ela antes do tempo para este mundo dos vivos; terminado pela metade e isso tão imperfeitamente e fora de moda que os cães ladram para mim quando paro perto deles, pois bem, eu neste tempo de serena e amolecedora paz, não acho delicia em passar tempo, exceto espiar minha sombra ao sol e dissertar sobre minha deformidade”, diz o Duque de Glóster, futuro Ricardo III, na primeira cena do ato primeiro de Ricardo III de Shakespeare.

    Impossível, diante deste texto,  não olharmos para nós mesmos neste inacreditável início de século.  Como não cotejar as faces de Lula, Dirceu, Toffoli, Maia, Alcolumbre, Bolsonaro, Lewandowski, Neymar, 01-02-03, Ibaneis, Greenwald, Guedes, Maria do Rosário, Ciro Gomes, Haddad, Fernando Henrique, Moro, Serra, Dória e toda a matilha que ladra, baba e rosna nos corredores, gabinetes, plenários e microfones do Congresso Nacional. Como não ver no olhar  desses atores, as palavras arregaladas do Duque de Glóester.

    Todos, a seu modo, vendem virtudes para entregar o inferno. Todos, em seu timbre e conveniências, bradam o bem enquanto edificam o mal. Sim, vivemos um tempo perplexo e incomum. Valores e referências que constituem percepções e sentimentos profundos da nossa civilização claudicam diante de cenários futuros incertos, em que pese uma exuberância jamais vista  de possibilidades.  Sim, parece que vivemos com a angústia daqueles que tiveram o  Paraíso perdido.  Sim, como no imaginário fantástico da Grécia clássica temos que resgatar um novo Campos Elísios, Deuses e Deusas, como a divina Afrodite, Deusa do amor, da beleza e da perpetuação da vida, que nasceu da suavidade melódica das espumas do mar.


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