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Jorge Henrique Cartaxo
  • 20/06/2019 10h38

    Sobre o estilo

    Se lhe fosse dado a graça de um passeio pela América contemporânea, Buffon certamente voltaria ao túmulo mais do que ruborizado

    Conde de Buffon( foto: arquivo do colunista)

    Bizarrices não faltam aos nossos chefes de estado e de governo. Jânio, Collor, Lula, Dilma e agora Bolsonaro animam o anedotário da vida política brasileira. Jânio e suas intrigas com as brigas de galo e os biquínis. Collor com o seu “aquilo roxo”. Lula com sua exposição sobre os desafios do clima e o inconveniente da Terra ser redonda e não quadrada. Dilma e a sua incapacidade de estocar vento. Nessa quadra, o Jair Messias e sua extraordinária falta de modos e fixação pelas armas, dentre outras dissonâncias. 

    No  clássico discurso na solenidade da sua recepção na Academia Francesa no dia 25 de agosto de 1753, George-Louis de Leclerc, Conde de Buffon, autor da monumental Histoire Naturelle, cunhou uma frase clássica desde então: “Le style, c’est l’homme même” ( O estilo é o homem). Elegante e refinado, Leclerc discorre longamente sobre a forma e o conteúdo das palavras dos homens na história. “Em todas as épocas houve homens que souberam ordenar aos outros pelo poder das palavras”, diz ele no início de sua oração naquele longínquo verão parisiense.

    Reverenciando a cena  e as circunstâncias daquele século de luzes, George-Louis vai expondo com didatismo e precisão a diferença entre a eloquência e o simples ato de dizer. Neste, a facilidade de falar, a capacidade mecânica de transmitir ao outro entusiasmos e afetos. Naquele, o texto não ocupa o ouvido e nem impressiona aos olhos, antes sensibiliza o espírito, age sobre a alma e toca o coração. “O estilo é apenas a ordem e o movimento que se instaura nos seus pensamentos. Se eles forem encadeados de modo apropriado, se forem ajustados, o estilo torna-se robusto, nervoso e conciso”, sublinha o Conde de Buffon.

    Se lhe fosse dado a graça de um passeio pela América contemporânea, Buffon certamente voltaria ao túmulo mais do que ruborizado. Trump espanta o mundo com suas estultices e palavreados, ainda que sentado num trono digno de Luizes aconselhados por Richelieus, e Bolsonaro, carente de Andrada na cabeceira, vociferando toda sorte de ofensa ao vernáculo e aos bons modos, asseveram que nunca o estilo fez tanta falta aos homens neste século que se anuncia.

    A ausência de estilo nos pronunciamentos públicos não só merece apreensão porque eventualmente não sensibiliza o homem comum o quanto incomoda aqueles que sabem do valor do ordenamento simbólico e consistente das boas palavras e conceitos. Mas, sobretudo, porque sem estes não será permitido aos homens a construção necessária da virtude sem a qual a ordem que une os  povos no tempo e desafios, necessariamente, perece.

                                      

                                                  


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