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- Contato Brasil, 23 de dezembro de 2024 05:45:44
São Paulo é feia e cinzenta. Mas guarda preciosidades surpreendentes e encantadoras nas sinfonias profundas da sua alma. No último final de semana, revisitei a nossa New York da periferia com duas motivações: contemplar a exposição de Tarsila do Amaral no MASP e assistir a um concerto na Sala São Paulo. Claro, entre um momento e outro a deliciosa gastronomia do lugar com seus sabores e vinhos. Tive tempo também de ver uma exposição do Burle Marx no Museu Brasileiro da Escultura e da Ecologia e descobrir a Casa-Museu Ema Klabin, na rua Portugal. Fantástica!
Filha de uma grande família judaica da Lituânia, que chegou ao Brasil no final do século XIX e aqui empreendeu e fez grande e perene fortuna, Ema Klabin já era uma personagem da cena paulista, quando construiu, na década de 1950, seu Petit Château na região dos Jardins. Inspirado no Palácio de Sanssouci, em Potsdam, nos arredores de Berlim, a bela residência, edificada nas margens de um jardim de Burle Marx, emana o gosto, o estilo, a personalidade forte, a elegância suave e o prazer estético e intimista de Ema Klabin. Assim, sempre em diálogo com obras de Greuze, Frans Post, Batoni, Allori, Segall, Tarsila, Renoir, arte colonial brasileira da talha do Mestre Valentim, arte do Japão, da China e da África, porcelanas que pertenceram a Dom João VI quando do seu desembarque no Brasil em 1808, a boa música, gastronomia, uma biblioteca que dentre outras preciosidades coleciona a Divina Comédia de Dante, na edição de 1502 de Aldus, e History of Brazil de Robert Southey, além de um magnífico mobiliário feito absolutamente sob forma e medida para aquele lugar, Ema Klabin viveu e nos legou esse recanto aprazível da memória, dos modos, do espírito e da beleza.
Antes de deixar aquele lugar de apaixonante bom gosto, já na flora poetizada pelas mãos de Burle Marx, folheando a edição comemorativa dos dez anos da Fundação, vi no texto de Celso Lafer, presidente da Instituição e sobrinho de Ema, inspiradora observação sobre um dos quadros do acervo, Torre de Babel, de um seguidor não identificado da Escola de Bruegel. “O tema da Torre de Babel renova o significado do relato bíblico, atribuindo relevo histórico à grande e originária metáfora da pluralidade dos discursos e das dificuldades de comunicação. A Torre de Babel coloca a capacidade de traduzir como um fio de Ariadne. É o meio para sair do labirinto da incomutabilidade que caracteriza a ‘máquina do mundo’ em que vivemos”. Lúcido, erudito e profético!