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Misto Brasília - Por Gilmar Correa
  • 23/01/2018 15h10

    Como se constrói um discurso

    As distorções de comportamento, por mais individual que possa parecer, seguem uma lógica definida

    Pintura Moeda de Cesar, do pintor português Domingos Sequeira/Arquivo/Reprodução

    As redes sociais estão violentas – não é nenhuma novidade. A falta de senso abriu as entranhas de uma sociedade hipócrita. E olha, não estamos falando só da terra de Macunaíma, mas de um fenômeno mundial onde as notícias falsas, por exemplo, têm mais valor que os fatos.

    As distorções de comportamento, por mais individual que possa parecer, seguem uma lógica de quem está no poder político ou econômico. Os embates da arraia miúda – como se dizia há algum tempo – são definidos pela cúpula dominante.

    A situação estaria tão maluca, que a “cultura da classe trabalhadora está sendo seqüestrada para ajudar a elite", como escreveu Paul Mason, no Guardian (jornal inglês). Vejamos:

    01 – A era petista foi embalada por uma carta que agradou o chamado mercado, o establishment, ou seja, quem tem a bufunfa.  Antonio Palocci escreveu “Sobre formigas e cigarras”. Trabalhou como ninguém e hoje denuncia o sistema que ajudou a perpetuar. Abriu o bico, por assim dizer. E nos governos corruptos que se seguiram, sobrou um discurso populista, cuja estrela é o Bolsa Família.

    02 – Na época do mensalão, Lula da Silva cunhou uma frase-lema: “Eu não sabia”. Virou piada, como se sabe. Tinha uma esmagadora maioria no Congresso Nacional, mas sua fragilidade foi blindada por incrível que possa parecer pela oposição. Leia-se os tucanos, que fizeram um acordo para não apresentar e turbinar o impeachment. E tinham elementos para isso, como a declaração de um publicitário que recebeu R$ 10 milhões ilegalmente e, no exterior, para pagar a campanha eleitoral.

    03 – O PT nasceu com um discurso da ética. A pureza era a premissa orgânica para chegar ao poder. Balela. Fez acordos, comprou parlamentares, se aliou a coronéis da política do atraso e hoje continua a defender essa sujeira para voltar ao poder. E, surpresa, fecha os olhos para a corrupção, seu precioso discurso de 30 anos.

    04 – A estratégia diversionista é bater em Moro, o juiz que seria perfeito para três décadas atrás. Como rebarba, reclamam que não tem tucano abatido em pleno voo. Antes, reclamavam que a Lava Jato não pegava políticos. Quando começou a pegar, levantaram o discurso do ataque contra a democracia e a perseguição jurídica. Sempre é bom lembrar que tem gente presa, processada ou delatada ou beneficiada pelo instituto da delação que trabalhava para o PT, PMDB, PSDB, PP, PR e por ai vai. Enfim, gente que servia, serve e talvez vá ainda servir ao sistema num futuro próximo.

    05 – Há dois, três anos atrás, multidões tomaram as ruas. Alguns de vermelho, outros de verde e amarelo contra “n” mazelas, a principal delas a corrupção. Nos últimos dias, as redes sociais se “revoltaram”, porque a Polícia Federal mostrou Sérgio Cabral de algemas e correntes indo para o presídio. Tadinho! Oras, a “indignação” tem endereço certo. Corruptos não podem ser apresentados dessa forma, porque quem está no poder, esteve ou almeja voltar não tem interesse nessas imagens. É fazer haraquiri com a própria espada. E dá-lhe a arraia miúda se digladiar.

    06 – Ao se compadecer de Sérgio Cabral, um notório bandido já condenado, revela-se a outra moeda desta personalidade. A maioria dos brasileiros apoia a pena de morte e para muitos, seria melhor explodir todos os presídios com toda a sua população carcerária. A compaixão não tem perdão para bandidos comuns. Outra vez, a lógica do poder (alguns chamam de poder branco) se revela.

    Por fim, como escreveu Luciano Braga Ramos, logo na introdução do seu trabalho “Poder e discurso, discurso e poder”, por trás dessas tendências se escondem ou se camuflam as práticas de poder e seus discursos, que são objetos manipulador da opinião pública.


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