Páscoas de minha infância. Fartura de comida, mas dinheiro contado. No Natal era tempo de sapatos novos para a família toda. As caixas zelosamente guardadas. Também no Natal fazia-se muitos doces.

Mês de novembro era tempo de estocar ovos para o seu feitio. Quando a mãe e a Dinda preparavam a massa, as cascas eram lavadas, secas e guardas em latas. Na semana santa eu cortava dezenas de varetas de bambu que eram fincadas em baldes de areia. As cascas eram fervidas com cebolinha vermelha e flores de marcela. Ficavam vermelhas ou amarelas.Lá ficavam espetadas nas varetas secando.

A mãe comprava pequenas latinhas de tintas nas cores brancas, verde,e azul para pequenos desenhos nas casquinhas. As velhas caixas de sapatos se transformavam em cestinhas decoradas com papel crepom. Eram forradas com capim-colchão e marcela e recheadas com as casquinhas cheias de amêndoas.

Em cada cesta um ovinho do tamanho de um ovo de pombo e uma barrinha de chocolate Saturno. Tia Tereza, mocinha, vinha ajudar. Enquanto as mulheres cuidavam dessas coisas, meu pai providenciava a roçada das testadas das estrada e caminhos e limpeza das valetas. "Para o coelho não se perder". Sexta-feira recolhimento.

Não se mexia na terra nem pegava-se em aço. Então nada de ferramentas, tallheres, arreios e armas. Fogo não era aceso.Espelhos cobertos. Até os animais pareciam aquietar.

Comida era amendoim torrado de véspera. Ainda bem que na época sempre tinha abundância de tangerinas, laranjas e bananas. Saía sorrateiro para os campos e me empanturrava. Meus pais fingiam que não notavam.

No sábado a coisa começava alta madrugada. Matar boi, porco, galinha, fazer recheio, morcella e linguiça, temperar pernil. Domingo todo mundo na missa das seis e correr de volta para casa. Procurar as cestas e esperar tios e primos para o almoço. Casa cheia, família unida, Tempo feliz.

[Texto do jornalista João Francisco da Silva]