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- Contato Brasil, 04 de dezembro de 2024 06:00:42
O deputado Zé Silva (Solidariedade-MG) destacou, em entrevista exclusiva a este blog, que o governo Lula 3 não pode ser um “replay” das gestões anteriores do petista entre 2003 e 2010. E que tampouco seja parecido com o que foi a gestão da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT).
Segundo ele, a nova gestão de Luiz Inácio Lula da Silva precisa entender que estamos diante de “um novo mundo, um novo Brasil” com “uma lógica totalmente diferente”, desde os desafios impostos pela “tecnologia da informação” até e os novos “arranjos geopolíticos”. “Segundo, [Lula] também não pode ser o presidente do partido dele, o PT. Tem que ser um presidente do arranjo partidário [que o elegeu novamente] para a retomada da economia brasileira”, pontuou.
Zé Silva destacou também que Lula “não pode deixar o Brasil isolado” como o país ficou nos últimos quatro anos durante o governo Bolsonaro. Líder do governador Romeu Zema (Novo) no Congresso Nacional, ele pediu ainda que a nova gestão de Lula inclua todos órgãos do governo federal na plataforma “Mais Brasil” para facilitar que todos possam acompanhar os andamentos das obras tocadas com recursos federais.
Criado na gestão passada, a plataforma “Mais Brasil” (https://portal.plataformamaisbrasil.gov.br/), antigo Siconv (Sistema de Convênios) criado em 2008, não dispõe de 100% das informações referentes a todas obras realizadas ou aportadas pelo governo federal. “Eu até tenho citado, se eu fosse o presidente da República, eu editaria rapidamente um decreto obrigando que todos os ministérios e órgãos públicos federais passassem pela plataforma Mais Brasil”, comentou o parlamentar mineiro autor do livro Obras Paradas - entrave para o desenvolvimento do Brasil lançado em 2019 com um raio-X das iniciativas que contam com aportes federais e que se encontram paradas, fruto dos trabalhos da comissão externa da Câmara dos Deputados sobre obras públicas paralisadas e inacabadas no país.
Essas e outras declarações constam da entrevista abaixo.
Blog: Como resolver esse problema das obras paradas? Poderia ser criado um ministério para resolver esta questão?
Zé Silva: Eu não vejo necessidade de se criar um Ministério. Assim que eu cheguei no Congresso Nacional, eu comecei a estudar o tema e a ver que não há nenhum município do Brasil que não tenha uma obra parada. Foi assim que em meu terceiro mandato, eu fui o primeiro a criar uma comissão de obras paradas, passei a ser um estudioso do tema, inclusive, em 2019, [lançamos] um livro [intitulado “Obras paradas - entrave para o desenvolvimento do Brasil], eu percebi que as causas delas são muito ligadas não a questões financeiras. Para se ter uma ideia, em 2018, 2019, quando se tinha mais de 14 mil obras paradas no Brasil, a primeira grande causa são as falhas no projeto executivo - com aproximadamente 39% [do total]. A segunda causa das obras paradas é o licenciamento ambiental e há projetos, que, inclusive, dependendo do seu porte, chega a 27% do seu custo só com licenciamento ambiental. Então quando se soma falha no projeto mais licenciamento ambiental se dá metade das obras paradas no Brasil. E aí no governo do presidente Temer, ele criou um comitê diretamente na Presidência da República e quem era o secretário desta comissão em que eu presidia era o atual governador de São Paulo hoje, o Tarcísio de Freitas, e que depois o presidente da República levou ele para coordenar este comitê. Então, nesta época, nós atacamos diretamente estas causas [em que] foram retomadas mais de 1600 obras especialmente de saúde e educação. Já que [a paralisia destas] obras de saúde e educação, elas são as que mais prejudicam as populações dos pequenos municípios [como] uma unidade de saúde num distrito, numa vila, num bairro carente e também, na área da educação, as creches onde as pessoas precisam trabalhar e deixar seus filhos. Mas há também outras causas como, por exemplo, empresas que ganham as licitações dessas obras e pelo tempo, que eu chamo de vida útil do projeto, elas abandonam as obras. então, com isso, o próprio presidente Temer publicou à época uma portaria, que toda obra da saúde é liberada agora com 100% do recurso. Havia uma resistência do governo dizendo que nem sempre os municípios têm capacidade, mas eu [argumentei]: bom, eu tenho que trabalhar na perspectiva dos municípios que funcionem e aí ele [Temer] acatou a sugestão, e hoje as obras da saúde já é um percentual bem pequeno porque o recurso é liberado 100% de uma vez e aí o governo só cobra a aplicação do recurso. Já na educação, há um sistema muito eficaz de gerenciamento que se chama Simec (Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle), eletrônico, mas [o recurso] continua saindo parceladamente. Nesse [novo] governo do presidente Lula, das oito mil obras paradas que [temos], quase quatro mil são da educação. Então, eu continuo defendendo que o recurso seja liberado só em uma parcela para que as empresas e, geralmente, nos pequenos e médios municípios, as empresas também são de pequeno porte, que não tem capital de giro, e com certeza melhorando os projetos, o licenciamento ambiental e liberando só em uma parcela, nós com certeza resolvermos grande parte das obras paradas do Brasil.
Blog: Resolver esse gargalo das obras paradas melhoraria nossas condições de crescimento?
Zé Silva: A retomada das obras, com certeza, ajudará a dinamizar a economia. Mas esse contingente de aproximadamente oito mil obras paradas, eu creio que não faria diferença no crescimento do país. é muito mais eficaz aprovar alguns projetos que tramitam, inclusive, alguns de minha autoria no Congresso Nacional, para garantir que os estudos, as fiscalizações do TCU (Tribunal de Contas da União) venham ser incorporados na plataforma Mais Brasil, porque o governo desde que começamos esse trabalho no ano de 2016 e 2017 para não termos obras paradas aperfeiçoou o sistema. Onde eram colocadas essas informações é hoje um sistema mais abrangente. Só que nem todos os recursos do governo federal [destinados] para os mais de 5500 municípios passam pela plataforma Mais Brasil. Então, na minha visão, se resolver esta questão de liberar em única parcela, especialmente as obras da educação e também 100% dos recursos do governo federal passarem pela plataforma Mais Brasil, eu tenho certeza que, inclusive, [o programa] Minha Casa, Minha Vida que está sendo retomado, nós dinamizaremos a economia. Eu até tenho citado, se eu fosse o presidente da República, eu editaria rapidamente um decreto obrigando que todos os ministérios e órgãos públicos federais passassem pela plataforma Mais Brasil. Por que aí o cidadão vai poder acompanhar lá de sua casa, nesta plataforma, se tem uma obra em andamento, se ela está adiantada, ou se está atrasada.
Blog: A dependência do sistema de transporte rodoviário e aéreo, praticamente os únicos existentes no país, é um forte fator que trava o desenvolvimento brasileiro. Até os anos 50, o principal moldal de transporte era o ferroviário, que por falta de investimentos, sucumbiu. Como fazer com que o sistema férreo volte a ser uma opção de transporte e logística, não apenas para a produção, mas, sobretudo e também, voltado para passageiros e atender as demandas do turismo?
Zé Silva: Primeiro, o Brasil, se formos avaliar os sistemas de desenvolvimentos adotados, [nos mostrará] que fizemos inúmeras opções equivocadas. Se eu pegar no campo do desenvolvimento urbano, que é desordenado, é porque o Brasil criou políticas públicas que fez a população do campo fosse para a cidade. Isso foi uma decisão equivocada. Precisávamos que a população do campo tivessem a oportunidade de escolher ficar no campo, mas com qualidade de vida. A pior escola [era e] é na área rural, quando se tem pavimentação só tem na cidade, a área para praticar esporte também só na cidade. Quando eu falo da logística, fazendo este mesmo raciocínio, também fizemos opção por um modelo equivocado. Ao invés de fazer das ferrovias, que já tínhamos aqui uma infraestrutura inicial muito adequada, e também em fazer a opção pelas hidrovias, em que temos uma rede de rios fantásticos para se fazer um transporte muito mais barato e seguro, nós optamos pelo transporte rodoviário, que é perigoso, caro e reduz a competitividade dos produtos brasileiros. Em Minas Gerais, eu participei ativamente do governo do hoje ministro do TCU, Professor Anastasia, ele desenvolveu um sistema das parcerias público-privadas, inclusive, fazendo infraestrutura no estado. Então, na minha visão, eu faço essa defesa muito fortemente e o Brasil para retomar a sua capacidade de logística ferroviária, não só de cargas, mas também de pessoas, inclusive, nos centros urbanos [dos veículos leves sobre trilhos], os próprios metrôs [e trens metropolitanos] precisam fazer cada vez mais um sistema de parceria-público-privada. O Brasil é um país de economia internacional, o mundo espera que até o ano de 2050 [consigamos produzir] 40% a mais de alimentos que o mundo precisa. E isso é uma responsabilidade muito grande, mas também uma oportunidade para sermos competitivos e para isso precisamos reduzir o custo Brasil com a chegada dos fertilizantes, insumos, da energia, da transição energética que nós precisamos, da mineração - que o Brasil é um gigante da mineração, mas eu vejo essa perspectiva e temos estas boas práticas como, por exemplo, o setor sucroenergético que são as usinas de açúcar e álcool de Minas Gerais tem feito essa parceria-público-privada lá em diversas áreas de infraestrutura. Então, o caminho para o Brasil é isso e é preciso de decisão política porque o arranjo econômico nós temos de boas práticas e é possível elas serem implantadas.
Blog: Qual a sua avaliação deste novo governo Lula, apelidado de Lula III?
Zé Silva: Primeiro, o que não deve ser o governo Lula: ele não pode ser um replay dos outros dois mandatos e nem do mandato da ex-presidenta que ele elegeu. É um novo mundo, um novo Brasil, uma lógica totalmente diferente, quando eu penso na tecnologia da informação e dos arranjos geopolíticos. Segundo, ele também não pode ser o presidente do partido dele, o PT. Tem que ser um presidente do arranjo partidário para a retomada da economia brasileira. O terceiro ponto é que ele não pode deixar o Brasil isolado. Eu participei das últimas conferências mundiais do clima e o tema, especialmente das mudanças climáticas e ambientais, [colocam] o Brasil no foco do mundo. Porque nós temos a Amazônia aqui e tudo o que acontece na Amazônia impacta o mundo inteiro. No governo do presidente Bolsonaro, ele teve muitas dificuldades nas suas narrativas, nos diálogos com os outros países em relação à agenda climática. E isso impacta a vida de cada cidadão e impacta, principalmente, as principais cadeias produtivas que garantem o superávit da balança comercial brasileira. Então, o presidente brasileiro precisa [fazer esta correção de rumo].
Blog: Para encerrar, qual balanço você faz destes anos em que atuou como deputado federal? Quais são suas considerações finais?
Zé Silva: O que me trouxe ao Congresso Nacional foi especificamente o agro, o agro familiar. [Por ser] de carreira da Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais) e viver o campo e todas as nuances das dificuldades do campo, até com essa bandeira de fazer com que as pessoas do campo, da roça, tenham as mesmas oportunidades que o pessoal da cidade, a gente muda o Brasil. Mas chegando aqui, eu ampliei essa pauta do nosso mandato para uma pauta ambiental, das negociações internacionais para dar competitividade ao Brasil. Assim como a pauta da mineração sustentável. Eu presidi a comissão [externa que avaliou os impactos da queda de barragem de] Brumadinho durante os quatro anos e pude ver que a mineração não pode viver das tragédias, ela tem que viver das boas práticas, trazer desenvolvimento, trazer qualidade de vida, já que o Brasil é um gigante, como é no agro, na mineração. E eles são muitos sinérgicos. Ambos são base de sustentação e o outro pilar do meu mandato é a retomada das obras paradas, que hoje é uma pauta muito importante do Congresso Nacional. E para destacar sou líder do governo Zema aqui no Congresso Nacional, eu pretendo fazer com muita dedicação e esforço, não faltando aos desafios de Minas, essa ponte entre Minas e Brasília, entre o governador e o presidente e entre os secretários de estados e os ministros para que Minas Gerais possa cada vez mais se desenvolver e conquistar aí rapidamente o segundo lugar na economia brasileira e que isso seja revertido em qualidade de vida e em desenvolvimento para todos nós.