31 de julho de 2025
PODER JUDICIÁRIO

Veja a íntegra do discurso do ministro Edson Fachin no encerramento do ano legislativo de 2025; ele assumiu o cargo no lugar do ministro Barroso, hoje aposentado.

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Por Política Real com assessoria
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Edson Fachin em fala na íntegra Foto: Rosinei Coutinho/STF

(Brasília-DF, 19/12/2025). A Política Real veiculou em nossa conta do Ao Vivo do site o discurso na íntegra do ministro Edson Fachin, presidente do Supremo Tribunal Federal(STF).

Ele assumiu a presidência no dia 26 de setembro de 2025 em substituição do ministro Luis Roberto Barroso do qual foi vice-presidente no último biênio.

Ele fez questão de citar o ministro Barroso, agora aposentado.

 

Veja a íntegra do discurso:

 

 

Hoje, 19 de dezembro, termina o Ano Judiciário de 2025. Ao encerrar este ciclo de

trabalho, dirijo-lhes algumas palavras que se destinam tanto ao agradecimento

institucional quanto à reflexão sobre o papel constitucional desta Corte.

 

Cumprimento a Excelentíssima Ministra Cármen Lúcia e os Excelentíssimos Ministros

do Supremo Tribunal Federal, na pessoa de seu Decano, Ministro Gilmar Mendes, pelo

elevado padrão de dedicação e compromisso demonstrado ao longo do ano, bem como

pelo apoio, pela colaboração e pela convivência respeitosa que marcaram os trabalhos

deste colegiado. Registro, igualmente, meu reconhecimento ao Ministro aposentado

Luís Roberto Barroso, que me antecedeu na Presidência do Tribunal e do Conselho

Nacional de Justiça, e cuja atuação foi decisiva na condução de julgamentos relevantes

e na implementação de importantes projetos institucionais.

Da minha parte, o início da gestão à frente desta Corte se deu a partir de 29 de setembro,

período curto em termos cronológicos, mas suficiente para evidenciar a complexidade

das atribuições que a Constituição de 1988 confiou ao Supremo Tribunal Federal, bem

como a responsabilidade inerente ao exercício da jurisdição constitucional em um país

plural, desigual e de dimensões continentais.

Expresso minha gratidão às servidoras e aos servidores do Tribunal, às estagiárias e aos

estagiários, colaboradoras e colaboradores, cujo trabalho técnico, contínuo e muitas

vezes invisível sustenta o funcionamento regular da Justiça constitucional. Este

Tribunal é composto por pessoas concretas, que, para utilizar a expressão do professor

Pietro Barcellona, são “pessoas de carne e osso”, e que, no exercício de suas funções,

contribuem diretamente para a guarda da Constituição e para a efetividade do Estado de

Direito.

Saúdo a todas e a todos na pessoa da Doutora Carmen Lilian, Secretária do Plenário, e

reitero que servir ao Supremo Tribunal Federal é servir à democracia brasileira. É por

meio desse trabalho cotidiano que a Justiça se realiza como prática institucional e não

apenas como promessa normativa.

Cumprimento o Procurador-Geral da República, doutor Paulo Gonet, com quem

compartilhamos a responsabilidade de promover a ordem jurídica, o regime

democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis. Estendo meus

cumprimentos às defensoras e defensores públicos, às advogadas e aos advogados,

públicos e privados, às servidoras e aos servidores das demais carreiras da Justiça, à

imprensa, às estudantes e aos estudantes que nos visitam e, especialmente, às cidadãs e

aos cidadãos brasileiros, destinatários últimos da atividade jurisdicional.

No ano de 2025, o Supremo Tribunal Federal recebeu 85.201 processos, distribuídos

(38%) ações originárias e (62%) processos recursais – em relação ao ano anterior, houve

um aumento de 21% no recebimento de processos originários e redução de 4,2% no

recebimento de processos recursais.

Foram proferidas 116.170 decisões, tantos em processos originários quanto em feitos

recursais.

Do total de decisões, 80.5% foram proferidas monocraticamente, e 19.5% de forma

colegiada. Houve, em relação a 2024, um aumento de 5,5% no número de decisões

colegiadas, o que revela o esforço institucional de fortalecimento da colegialidade e

da deliberação plural.

No Plenário, foram realizadas 74 sessões presenciais, além de 41 sessões plenárias

virtuais e 15 sessões plenárias virtuais extraordinárias. Ao todo, foram julgados e

finalizados 6.177 processos, sendo 61 no sistema presencial.

Na Primeira Turma, foram realizadas 38 sessões presenciais e 47 sessões virtuais, nas

quais foram julgados e finalizados 8.206 processos.

Na Segunda Turma, foram realizadas 14 sessões ordinárias e 44 sessões virtuais, nas

quais foram julgados e finalizados 8.158 processos.

O acervo atual contabiliza 20.315 processos em tramitação, representando redução de

2,1% em relação ao estoque existente ao final de 2024. É o menor acervo dos últimos

31 anos.

Em 2025, foram baixados 85.629 processos, número que, embora demande análise

contextualizada, indica a manutenção de um fluxo significativo de julgamento e

racionalização do acervo.

Também faço registro da realização de audiências públicas e audiências judiciais,

instrumento essencial para o aprimoramento da jurisdição constitucional em

matérias de alta complexidade fática, técnica e social. Destacam-se, nesse contexto,

as audiências públicas realizadas sobre temas como execução de emendas

parlamentares, políticas ambientais, regulação sanitária, transformações nas relações de

trabalho e direitos autorais na era digital.

Em 2025, foram distribuídas 13.882 Reclamações, um aumento de 37% em relação ao

ano passado.

Quanto à Repercussão Geral, 75 novos temas foram afetados à sistemática, com o

reconhecimento da existência de Repercussão Geral em 40 deles e reafirmação de

jurisprudência em outros 13. Em 22 dos novos temas, foi afirmada a ausência de

Repercussão Geral da controvérsia, o que evitou a subida de milhares de processos.

Entre as repercussões gerais já reconhecidas, 51 temas tiveram o mérito julgado,

liberando com isso mais de 220.257 processos sobrestados nos tribunais de origem.

Ainda foram concretizadas 28 audiências de conciliação pelo Núcleo de Solução

Consensual de Conflitos (NUSOL), com seis acordos homologados. E, no momento,

o Núcleo de Processos Estruturais Complexos (NUPEC) monitora 10 processos.

No que diz respeito ao diálogo direto com a sociedade, informo que a Ouvidoria do

STF recebeu 49.657 manifestações em 2025.

Também foram computados 148 registros de competência da Ouvidoria da Mulher,

que oferece atendimento especializado no acolhimento de vítimas de assédio e violência

contra a mulher, bem como de demais questões relacionadas a gênero e diversidade.

No exercício da jurisdição constitucional, a Corte concluiu, ao longo do ano,

julgamentos de elevada relevância institucional, nos quais reafirmou a centralidade da

Constituição como parâmetro de validade das leis e dos atos do poder público, bem

como o compromisso com a proteção dos direitos fundamentais, a preservação da

democracia e a observância do princípio da separação de Poderes.

Além da atividade jurisdicional, o Tribunal avançou em projetos institucionais voltados

ao fortalecimento dos direitos humanos, à modernização administrativa, à

sustentabilidade ambiental e à ampliação do diálogo institucional e acadêmico,

tanto no plano nacional quanto internacional, inclusive no contexto da diplomacia

constitucional e da cooperação entre Cortes.

O Supremo Tribunal Federal não faltou ao dever de aplicar e guardar a

Constituição.

No âmbito do Conselho Nacional de Justiça, foram implementadas iniciativas

voltadas ao aprimoramento da transparência, da integridade institucional, da inovação

tecnológica e da promoção dos direitos humanos, com destaque para ações afirmativas,

políticas de equidade racial e instrumentos de prevenção à violência doméstica e

familiar contra a mulher.

Esses dados e iniciativas refletem o cumprimento de um dever constitucional que se

expressa não apenas no ato de julgar, mas também na obrigação de prestar contas

à sociedade. Como observa Norberto Bobbio, a legitimidade democrática das

instituições depende da publicidade dos atos do poder e da possibilidade de controle por

parte da cidadania. A transparência, portanto, não é um atributo acessório, mas um

elemento constitutivo do Estado Democrático de Direito.

O exercício da jurisdição constitucional exige equilíbrio entre sensibilidade

institucional e racionalidade jurídica. Julgar implica decidir com base em fatos,

provas e argumentos, observando o devido processo legal, a ampla defesa e a segurança

jurídica, sem perder de vista o impacto concreto das decisões sobre a vida das pessoas.

Nesse sentido, a Constituição não é apenas um texto normativo, mas um projeto de

sociedade que se realiza na experiência histórica.

Nossa legitimidade decorre da fidelidade à Constituição e do respeito aos limites

institucionais que ela estabelece. Como advertiu Montesquieu, a concentração de

poderes representa risco permanente à liberdade, razão pela qual a separação funcional

entre Executivo, Legislativo e Judiciário constitui pressuposto essencial do

constitucionalismo moderno. Cabe ao Judiciário exercer sua função contramajoritária

com prudência, autocontenção e respeito às competências dos demais Poderes.

Desde há muito se realça que a consolidação da democracia depende da internalização

de práticas institucionais impessoais e da superação de personalismos que fragilizam as

estruturas republicanas. Essa reflexão permanece atual e orienta a atuação de uma Corte

Constitucional que deve decidir com base no Direito, e não em expectativas

circunstanciais ou pressões externas.

Ao mesmo tempo, a Constituição impõe a proteção de direitos que se projetam sobre a

vida concreta, o território e o meio ambiente. Davi Kopenawa nos lembra que não há

separação absoluta entre pessoas, natureza e futuro coletivo, advertência que reforça a

responsabilidade institucional do Judiciário na tutela do meio ambiente ecologicamente

equilibrado e dos direitos das presentes e futuras gerações.

Não fomos eleitos pelo voto popular, mas somos o Poder incumbido, pela Constituição,

de guardá-la e de assegurar sua supremacia. Essa missão exige serenidade, diálogo

republicano e compromisso com o sistema de freios e contrapesos, sem o qual a

democracia constitucional se enfraquece.

A democracia constitucional é, como já se observou com acerto, uma construção

permanente, que demanda vigilância institucional, responsabilidade decisória e

permanente atenção à legitimidade das Cortes. Cabe-nos exercer nossas atribuições

com rigor técnico, sobriedade e consciência histórica.

Não poderia, nessa direção, deixar de fazer referência à proposta, ainda em gestação, de

debatermos um conjunto de diretrizes éticas para a magistratura.

Considerando o corpo expressivo que vem espontaneamente tomando o tema no debate

público, dirijo-me à eminente Ministra e aos eminentes Ministros, e, também, à

sociedade brasileira, para dizer que o diálogo será o compasso desse debate.

O País precisa de paz — e o Judiciário tem o dever de semear paz. Mas sem ignorar o

dissenso, que é elemento vital da democracia. Divergências fundamentadas enriquecem

o trabalho jurisdicional, aperfeiçoam a técnica e reforçam a legitimidade das decisões.

O diálogo qualificado é instrumento de maturidade republicana.

O respeito ao dissenso exige também respeito às decisões regularmente proferidas, aos

votos divergentes e ao papel de cada instância. A autoridade de uma decisão reside

na força da razão pública que a sustenta.

No ensejo, expresso desde já meus agradecimentos pelo apoio e compreensão nesse

início de gestão.

Para 2026 creio termos um encontro marcado com alguns temas relevantes, dentre eles:

- atuação firme do tribunal para garantir a independência e a autonomia do Poder

Judiciário;

- aprofundamento da colegialidade e julgamentos ‘per curiam’;

- proteção da institucionalidade, do Estado de Direito democrático e consolidação de

uma rede latino-americana e caribenha de defesa da independência e autonomia judicial;

vale dizer, projetos voltados para as relações institucionais com as Cortes Supremas e

Tribunais Constitucionais dos países da América Latina;

- atuação pelos direitos humanos e fundamentais, inclusive no sistema interamericano

de direitos humanos;

- proteção da infância e da juventude, dos idosos e da mulher contra as inúmeras formas

de violência

- compromisso com a segurança jurídica, transparência, sustentabilidade;

- remuneração da magistratura; reiteremos: transparência é a chave quanto às

modalidades de remuneração. Nosso respeito intransigente à dignidade e valorização da

carreira, irá na mesma medida conter abusos;

- reafirmação do compromisso com ações fundadas na acessibilidade, na inclusão e no

respeito às diferenças e à diversidade;

- diretrizes e normas de conduta para os tribunais superiores, a magistratura em todas

as instâncias e no Supremo Tribunal Federal;

- reforma administrativa no âmbito da Presidência do tribunal e consolidação do Centro

de Estudos Constitucionais;

- ações conjuntas para o sistema prisional, defendendo gestão e financiamento como

ferramentas para reduzir o fortalecimento de facções e reiterando que políticas de

segurança pública devem andar juntas com proteção de direitos fundamentais;

- equidade racial e combate ao racismo;

- acesso à justiça aos mais vulneráveis.

Reitero hoje nossos compromissos assim sintetizados:

• segurança jurídica como base da confiança pública;

• sustentabilidade como dever intergeracional;

• diversidade, igualdade e respeito à pluralidade;

• transformação digital para aproximar a Justiça do povo;

• e, a permear tudo o mais, colegialidade na pauta, porquanto a força desta Corte está

no colegiado.

Enfatizo o compromisso com a plena liberdade de imprensa e a liberdade de

pensamento e de expressão.

É sabido quão exigente se mostra a tarefa de presidir. Recordo prontamente diversos

assuntos e procedimentos complexos que desafiaram as Presidências nos últimos dez

anos. Tais cenários surgem, com frequência, de modo grave e inesperado. O propósito

é fazer o melhor possível.

Tenho certeza de que assim pensaram meus antecessores e minhas antecessoras ao se

depararem com casos difíceis; assim também penso. A complexidade, por natureza,

tudo alcança. Quando não se acerta plenamente, espera-se ao menos errar da forma

mais sábia possível (à luz do ‘fail better’), buscando aperfeiçoar a cada passo.

Procura-se lidar com desconfortos escolhendo, entre as alternativas viáveis, o caminho

que melhor concilie os interesses e que seja, dentro do possível, o menos problemático

para a instituição e o mais próximo possível da harmonia.

Renovo o agradecimento pela colaboração e prestimosa atuação do Vice-Presidente

Ministro Alexandre de Moraes, registrando que Sua Excelência comigo dividirá, como

tem sido de praxe, o período de recesso para o exercício da Presidência do tribunal na

segunda quinzena de janeiro próximo.

Ao concluir, renovo meus agradecimentos a todas e a todos que integram este Tribunal.

Que o período de festas permita a renovação das energias e o fortalecimento dos

vínculos institucionais, para que possamos seguir desempenhando nossas funções com

responsabilidade, prudência e compromisso com o povo brasileiro, e que esta Corte

jamais se dobre a ameaças, venham de onde vierem, registrando, portanto, ao final

deste ano, o levantamento da injusta e inadmissível aplicação da Lei Magnitsky a Sua

Excelência, ministro Alexandre de Moraes, e seus familiares.

Desejo a todas e a todos um Feliz Natal e um ano de 2026 fraterno, produtivo e

comprometido com a Constituição da República.

 

( da redação com informações de assessoria. Edição: Política Real)