31 de julho de 2025
CHILE

CHILE EM DISPUTA: Candidatos de direita José Antonio Kast, Evelyn Matthei e Johannes Kaiser estão em disputa, um deles deverá ir para o segundo turno com chances de ser o próximo presidente do Chile

Os três candidatos, hoje, oscilam entre 14% e 20% das intenções de voto

Por Politica Real com agências
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Evelyn Matthei, José Antonio Kast e Johannes Kaise. Fotot: El País/Montagem Política Real

Com agência.

(Brasília-DF, 15/11/2025)  A chamada direita dive um momento de destaque nas eleições presidenciais do Chile. A direita concentra grande parte da disputa no primeiro turno das eleições presidenciais, segundo diversos analistas.

O candidato que conseguir mais votos provavelmente irá competir no segundo turno com a candidata do governo, Jeannette Jara, do Partido Comunista. Ela lidera as pesquisas eleitorais no país.

A disputa envolve três candidatos: José Antonio Kast, do Partido Republicano, qualificado como extrema direita; Evelyn Matthei, da coalizão Chile Vamos, que reúne a centro-direita tradicional; e Johannes Kaiser, do Partido Nacional Libertário, que se posiciona ainda mais à direita do que Kast.

Kaiser e Kast não aceitaram disputar as eleições primárias oficiais contra Matthei em junho passado — diferentemente do que fez a esquerda, que elegeu Jeannette Jara como sua candidata única. Por isso, ela e seus três oponentes estarão nas cédulas da eleição de domingo, 16 de novembro.

Kast é o mais bem colocado candidato da direita nas pesquisas de opinião há cinco meses, mas seu apoio vem diminuindo nas últimas semanas. Kaiser, por outro lado, vem subindo inesperadamente e já supera Matthei em algumas avaliações.

Os três candidatos, hoje, oscilam entre 14% e 20% das intenções de voto. E esta margem apertada, segundo os especialistas, deixa tudo em aberto para o dia da eleição, abrindo espaço para possíveis surpresas.

A disputa se torna ainda mais intensa, se considerarmos que, segundo a maioria das pesquisas, quem chegar ao segundo turno contra Jeannette Jara, em meados de dezembro, tem grandes probabilidades de vencer as eleições.

As pesquisas indicam que, conjuntamente, as diferentes facções da direita superam hoje os 50% das intenções de voto no Chile, enquanto a candidata do governo não conseguiria ultrapassar os 30%.

'Campanha asquerosa'

Isso explica, em parte, o porquê dos desencontros entre os candidatos, que vêm marcando esta campanha presidencial.

Evelyn Matthei liderava todas as pesquisas de intenção de voto até o mês de junho. Ela denunciou uma "campanha asquerosa" contra ela.

Matthei acusa diretamente o Partido Republicano, de José Antonio Kast, de supostas manobras de comunicação para reduzir o seu prestígio, questionar sua saúde mental e estabelecer uma "guerra suja" nas redes sociais.

Já a equipe de Kast questionou o bloco que apoia Matthei, principalmente pelo seu papel durante o governo de Sebastián Piñera (1949-2024), presidente do Chile por dois mandatos (2010-2014 e 2018-2022).

O principal assessor de Kast, Cristián Valenzuela, afirmou há algumas semanas que membros da oposição teriam atuado como "parasitas" do Estado, o que causou mal-estar nas fileiras da centro-direita.

Kaiser também não ficou para trás. Ele criticou Kast abertamente, por abandonar a "agenda de valores" e por estar disposto a fazer concessões à esquerda, em temas como a fracassada reforma da Constituição do país.

A atual disputa entre os diversos setores da direita tem raízes nos protestos sociais ocorridos no Chile em 2019, segundo o acadêmico e antropólogo social Pablo Ortúzar.

"Existe um novo divisor de águas na política chilena: não é mais o plebiscito de 1988, mas o processo político após os protestos sociais", declarou ele à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC. "E a direita está sofrendo este efeito."

"O Partido Republicano se distanciou do governo de Sebastián Piñera por não reprimir os protestos com mais força. Depois, Johannes Kaiser se desligou da coalizão de Kast por seus acordos para o segundo processo constitucional."

"Existe, então, uma disputa de fundo muito intensa sobre caráter, coragem, acusações de traição e covardia", segundo Ortúzar.

Johannes Kaiser: a surpresa desta eleição

Os especialistas concordam que a grande surpresa destas eleições é Johannes Kaiser, de 49 anos.

"Sem dúvida, ele é a novidade e demonstra que sempre é possível crescer rumo à direita", afirma o acadêmico da Escola de Governo da Universidade Adolfo Ibáñez (UAI), no Chile, Cristóbal Bellolio.

Kaiser, atualmente, é deputado e se apresenta pela primeira vez como candidato à presidência do país. Ele duplicou seu apoio no último mês, segundo as pesquisas de opinião.

Autodenominado libertário (como o presidente da Argentina, Javier Milei), Kaiser é considerado um outsider na oposição ao governo do presidente Gabriel Boric, da esquerda.

Ele criou sua própria agremiação (o Partido Nacional Libertário) no ano passado. Kaiser havia saído do Partido Republicano em 2021 e, no PNL, defende um discurso de ultradireita.

Kaiser promete que, se for eleito, irá fechar as fronteiras com a Bolívia, expulsar os estrangeiros com antecedentes penais e construir "campos de recondução" perto da fronteira, para receber as pessoas que ingressarem no país ilegalmente.

"Aqueles que não pudermos reconduzir, vou tentar honestamente conversar com o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, para ver se nos cedem espaço naquela prisão do país", destacou ele.

Kaiser também prometeu reformar a Promotoria, o Poder Judiciário e o sistema de processo penal chileno. Ele também abriu a possibilidade de conceder indulto às pessoas detidas por violação dos direitos humanos durante o regime de Augusto Pinochet (1915-2006), entre 1974 e 1990.

O candidato propôs ainda a eliminação ou fusão de ministérios, que seriam reduzidos dos atuais 25 para nove. E, na arena internacional, Kaiser tentará retirar o Chile de alianças como o Acordo de Paris e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, se chegar à presidência do país.

Para os especialistas, Kaiser conseguiu retirar votos de Kast entre os eleitores com maior tendência à direita, devido a uma suposta "transferência ideológica" dentro do mesmo bloco.

"Kaiser, hoje, é o verdadeiro desafiador", segundo Bellolio. "O ânimo contra as castas políticas está fazendo ele avançar."

O acadêmico destaca que o fato de Kast ter "abandonado" a batalha cultural. E a agenda mais conservadora de Kaiser abriu um espaço que ele soube aproveitar.

"Kast deixou de falar, por exemplo, que as mudanças climáticas não existem ou que irá eliminar o Ministério da Mulher", prossegue Bellolio.

"Ele deu estes temas de presente para Kaiser, pensando que seriam retóricas minoritárias, mas Kaiser se apossou da faixa mais radical da direita, mais dura, e se saiu bem."

Embora claramente ele tenha se saído bem, não se sabe ao certo se seu apoio atual, de fato, será suficiente para chegar ao segundo turno das eleições.

Kast e seu 'governo de emergência'

Seu principal concorrente é José Antonio Kast. Diferentemente de Kaiser, ele postula a presidência do Chile pela terceira vez.

Na sua primeira campanha, em 2017, Kast conseguiu apenas 8% dos votos. Mas, em 2021, ele revolucionou o tabuleiro político ao superar, no primeiro turno, seu rival da direita tradicional, Sebastián Sichel.

Kaiser, então, disputou o segundo turno com o candidato da esquerda, Gabriel Boric, atual presidente do país.

A derrota para Boric em 2021 não impediu que Kast se consagrasse como líder da direita radical. E seu Partido Republicano foi ganhando cada vez mais adeptos.

Em agosto passado, Kast chegou a somar cerca de 28% das intenções de voto, segundo as pesquisas. Este respaldo diminuiu e, hoje, está em cerca de 20%, mas segue acima de Kaiser e Matthei.

Filho de pais alemães que emigraram para o Chile em 1950, Kast é um velho conhecido da política chilena.

Anteriormente, ele militou no partido de direita União Democrática Independente (UDI), o mesmo partido de Matthei. Kast foi eleito deputado em 2002 e reeleito em três ocasiões.

Ele se caracterizou pelas suas posturas conservadoras em temas como o aborto, o casamento homoafetivo e a adoção homoparental, além da sua afinidade com o regime militar de Pinochet.

Mas, nesta campanha presidencial, diferentemente das anteriores, ele praticamente não abordou estes temas. Alguns acreditam que esta estratégia está relacionada à sua intenção de se tornar mais moderado e, com isso, conquistar um apoio mais transversal dos eleitores.

Consultado a este respeito, Kast declarou que, agora, não é o momento de abordar estes temas, mas sim de se concentrar em três grandes áreas: a segurança, a economia e a migração.

Por isso, sua principal proposta é de levar adiante um "governo de emergência", que consiga "recuperar a ordem" no país, reativar o crescimento econômico e controlar a migração ilegal, com o fechamento de fronteiras.

Kast também propõe um corte fiscal de US$ 6 bilhões (cerca de R$ 31,7 bilhões) em 18 meses. Mas a viabilidade desta medida vem sendo questionada tanto pela direita tradicional, quanto pela esquerda.

Matthei: a caça aos votos da centro-esquerda

Frente à concorrência de Kast e Kaiser, Evelyn Matthei precisou sair em defesa do seu projeto mais moderado.

Ela tenta fechar o apoio do centro à sua candidatura e buscar apoios até na centro-esquerda, incluindo diversas figuras que anunciaram que não irão apoiar a candidata comunista, Jeannette Jara — incluindo o ex-presidente Eduardo Frei (1994-2000).

Sua estratégia rendeu resultados.

Alguns dias atrás, 102 ex-autoridades e figuras da centro-esquerda anunciaram publicamente seu apoio à candidatura de Matthei. Eles defenderam que o voto é "antes de tudo, pela moderação, pela boa governança e pelo reencontro".

Matthei concentrou nisso sua estratégia. Ela prometeu que, se chegar à presidência, prevalecerá a elaboração de acordos entre todos os setores e que estará acompanhada da "melhor equipe" para unir o país.

A candidata da coalizão Chile Vamos representa, de alguma forma, uma trajetória política convencional.

Em seus mais de 30 anos de vida pública, ela foi deputada, senadora, ministra e prefeita de Providencia, na região metropolitana de Santiago. E também é a herdeira política do governo de Piñera, o único setor de direita que conseguiu governar o Chile, desde o retorno à democracia.

Mas Matthei não conseguiu aumentar seu apoio de forma considerável, segundo as pesquisas de opinião. Ela permanece estacionada em terceiro lugar, atrás de Jara e Kast. E poderá até ser superada por Kaiser.

Especialistas indicam que sua grande fraqueza está nos setores populares e nos jovens que buscam líderes com "personalidade", para enfrentar temas como a segurança ou a migração. Por isso, estes jovens estariam apoiando Kast ou Kaiser.

Mas a equipe de Matthei não perde as esperanças.

Eles apelam a um "empate técnico" entre as três candidaturas de direita e ao eleitor "invisível, escondido, não revelado" que, no momento, prefere não divulgar em público seu apoio à ex-prefeita, mas que, na hora de votar, colocará seu nome na urna.

A crescente força da direita no Chile

Existem vários fatores que, segundo os especialistas, explicam por que os candidatos de direita (especialmente, da direita radical) contam com alta adesão no Chile. Uma delas tem relação com uma tendência além das fronteiras do país.

"O mundo está vivenciando um fenômeno de 'direitização'", segundo Bellolio. Temos os casos de Javier Milei, de Jair Bolsonaro, de Donald Trump e tantos outros na Europa."

"Não devemos observar o que está se passando no Chile como uma singularidade, mas como um fenômeno mundial", destaca ele.

O acadêmico explica que isso ocorre porque existe uma certa noção de que, nos últimos tempos, a esquerda "fechou questão em termos do que é ou não aceitável e este é o momento da direita tomar isso de volta."

"O discurso woke se tornou frequente", segundo ele.

No caso chileno, existem também as prioridades que, hoje, preocupam os cidadãos do país.

O último relatório do Centro de Estudos Públicos do Chile indica que a grande maioria dos chilenos considera que o primeiro problema que o próximo governo deveria solucionar é a criminalidade.

"Este é um fator que favorece a direita", destaca Pablo Ortúzar. "Os temas de segurança e economia são próprios deste setor e dificultam a questão para a esquerda."

Por fim, os especialistas acreditam que é muito importante considerar o governo em fim de mandato, de Gabriel Boric.

"Como a esquerda está no poder, tudo indica que o beneficiário deste ciclo oposicionista é a direita", explica Cristóbal Bellolio. "Por isso, quem se apresentar como o melhor antagonista de Boric tem todas as chances de ganhar."

Esta situação também afeta a candidata do governo, Jeannette Jara, que foi ministra do Trabalho do presidente Boric.

"Acredito que Jara não tem opção", calcula o acadêmico. "Não só por ser comunista, mas porque representa o poder, o governo."

Negociações

A poucos dias das eleições, os três candidatos de direita sabem que é provável que apenas um deles passe para o segundo turno, competindo com Jeannette Jara.

Por isso, as equipes de Kast, Kaiser e Matthei já iniciaram conversações para garantir que, frente ao segundo turno de 14 de dezembro, quem vencer entre eles no primeiro turno conte com o respaldo do restante do setor.

José Antonio Kast defendeu em diversas ocasiões que, se não conseguir a vaga para o segundo turno em 16 de novembro, ele oferecerá seu apoio a qualquer candidato de oposição ao governo.

Já Matthei evitou expressar seu apoio a Kast. Mas ela declarou que não se vê "votando em uma pessoa que dê continuidade a este governo e ainda comunista".

Mas, mesmo que se apoiem mutuamente na eleição, os especialistas acreditam que o maior desafio virá se algum deles conseguir chegar à presidência.

"Será muito difícil formar pactos entre esses setores da direita para governar", alerta Ortúzar.

"É uma relação complexa e transferi-la para a administração do Estado não será apenas difícil, mas perigoso."

 

( da redação com informações da BBC. Edição: Política Real)