ESPECIAL DE FIM DE SEMANA: Renan cala-se e Cunha dá entrevista todo dia
Presidentes do Senado e da Câmara adotam posturas diferentes na primeira semana de recesso do Congresso Nacional
(Brasília-DF, 24/07/2015) Os presidentes da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), adotaram comportamentos diferentes na primeira semana de recesso do Congresso Nacional. Enquanto Renan Calheiros recolheu-se, evitando dar entrevistas, Eduardo Cunha esteve em seu gabinete na Câmara e falou com jornalistas sempre que foi abordado todos os dias em que ficou em Brasília.
Renan Calheiros só se manifestou por intermédio de uma nota na quarta-feira, 22. Disse que estava “rechaçando”, por ser improcedente, reportagem do jornal Folha de S. Paulo, noticiando que ele estaria articulando para dificultar a recondução do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao cargo.
Imparcialidade
A recondução de Janot precisa de aval da presidenta Dilma Rousseff em lista tríplice enviada pelo próprio Ministério Público. E o motivo da articulação de Renan Calheiros, de acordo com a Folha de S. Paulo, seria o vazamento de informações sobre envolvimento do presidente do Senado em corrupção, como resultado da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, na Petrobras.
Renan Calheiros afirmou, na nota, que a informação é totalmente “improcedente” e que ele mantém a imparcialidade que o seu cargo requer. Lembrou ainda que a escolha é da presidenta Dilma Rousseff e que a deliberação é do conjunto dos senadores e não uma vontade pessoal dele.
"Tiro no pé"
A Folha de S. Paulo noticiou que Renan Calheiros estaria trabalhando para retardar a votação do nome de Rodrigo Janot, e, assim, forçar a ocupação da Procuradoria-Geral da República por um interino. Um senador aliado dele lembrou que isso poderia ser um “tiro no pé”, já que o Ministério Público poderia acentuar ainda mais as investigações contra políticos envolvidos no esquema de corrupção.
Eduardo Cunha também é citado nas investigações. A divulgação de seu nome provocou seu “rompimento pessoal” com o governo na sexta-feira da semana passada, 17. O presidente da Câmara atribuiu o “vazamento” de seu nome a um conluio entre governo e o procurador-geral Rodrigo Janot.
"Vazamentos"
Mas nesta semana, Eduardo Cunha, apesar de se articular em Brasília numa tentativa de se livrar dos “vazamentos” de informações onde seu nome aparece, parou de atacar Rodrigo Janot. Seu comportamento é atribuído ao seu advogado, ex-procurador-geral da República Antônio Fernando de Souza.
Durante a semana, Eduardo Cunha falou sobre qualquer assunto que lhe foi perguntado pelos repórteres, menos sobre seu envolvimento em denúncias de corrupção. Quando perguntado sobre a Operação Lava Jato, respondia que seu advogado é quem dá informações sobre a questão.
Encontro com Lewandowski
Quando disse que estava rompido com o governo, o presidente da Câmara declarou que não usaria o cargo para prejudicar interesses do Palácio do Planalto. E que se trata de uma postura pessoal. Mas foi como presidente de um poder que ele foi se encontrar com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, terça-feira, 21.
No dia seguinte, quarta-feira, 22, Ricardo Lewandowski determinou que o juiz federal Sérgio Moro, do Paraná, encaminhe informações ao STF sobre o processo em que Eduardo Cunha é citado, antes do julgamento do caso. O presidente da Câmara também alega que tem foro privilegiado e que só pode ser julgado pelo Supremo no processo em que figura como envolvido no esquema de corrupção da Petrobras.
"Fuzil de guerra"
Na segunda-feira, 20, o presidente da Câmara afirmou que não está “com fuzil de guerra” contra o governo, reagindo a declarações do líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE). Guimarães havia dito que estava levantando a “bandeira branca da paz” para Eduardo Cunha.
"Não precisa estender bandeira branca porque eu não estou de fuzil de guerra", afirmou. "O fato de eu, na minha militância política, ter mudado meu alinhamento político não significa que o presidente da Câmara vai exercer a presidência da Câmara com viés de qualquer natureza”, assegurou.
"Alinhamento diferente"
“Eu estou num alinhamento político diferente do que eu estava antes. Esse alinhamento tem a ver com a minha militância política. Não tem a ver com o ato do exercício da presidência da Câmara", afirmou Eduardo Cunha. E acrescentou que conduzirá os trabalhos da Casa com independência, mas em harmonia com o Poder Executivo.
Na terça-feira, 21, Eduardo Cunha negou que exista uma crise institucional no país. Sua declaração foi motivada por entrevista do vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), classificando de “crisezinha” o rompimento do presidente da Câmara com o governo. “A palavra crise institucional é muito forte, é muito dura. O Brasil não está vivendo uma crise institucional”, disse Eduardo Cunha.
Meta não será cumprida
Na quarta-feira, 22, foi a vez de ele criticar as medidas econômicas anunciadas pelos ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, no mesmo dia. Eduardo Cunha ironizou a redução da meta de superávit primário ― economia de recursos para pagamento de juros da dívida pública ― de 1,19% para 0,75% do Produto Interno Bruto (PIB).
O presidente da Câmara afirmou que o governo já sabe também que não conseguirá cumprir esta meta. Disse ainda que o governo já deveria ter adotado a medida há mais tempo e citou frase do presidente do Senado, Renan Calheiros, dita uma semana antes: “O cachorro está mordendo o rabo”.
"Eles já sabem"
Quinta-feira, 23, Eduardo Cunha voltou a criticar as medidas do governo. Disse que a meta fiscal não será atingida, mesmo com a redução do superávit primário. “Essa meta não será cumprida e eles já sabem há algum tempo. Mesmo a que foi anunciada ontem (quarta-feira) já se sabe que não vai ser cumprida”, afirmou o presidente da Câmara. Em seu entendimento, o governo está em “desespero total por falta de arrecadação”.
Na mesma quinta-feira, Eduardo Cunha deixou Brasília prometendo voltar na segunda-feira, 27, e passar a última semana de recesso na capital do país. Enquanto isso, Renan Calheiros silenciou-se, depois de afirmar na sexta-feira da semana passada, 17, em pronunciamento na TV Senado, que o Brasil enfrentará dois meses nebulosos, em agosto e setembro, por conta de projetos “sensíveis” que serão votados pelo Congresso Nacional.
"Filme de terror sem fim"
Renan Calheiros referia-se a votação de vetos presidenciais, a CPIs e ao projeto de lei de Responsabilidade das Estatais. Ele disse que a disposição do Congresso Nacional é ajudar o país, sem ser manobrado pelo governo: “A disposição do Congresso Nacional é de colaboração. Esse sentimento, entretanto, não pode ser confundido com submissão ou omissão do parlamento”.
No entendimento de Renan Calheiros a situação é muito crítica para a nação. “Estamos na escuridão, assistindo a um filme de terror sem fim e precisamos de uma luz indicando que o horror terá fim. O país pede isso todos os dias”, afirmou.
(Valdeci Rodrigues, especial para Política Real. Edição de Valdeci Rodrigues)