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- Contato Brasil, 25 de abril de 2025 19:10:51
( Publicada originalmente às 11h 50 do dia 01/03/2023)
(Brasília-DF, 02/03/2023) Depois do senador Rodrigo Pacheco, presidente do Senado e do Congresso, falou a presidente do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, e o ex-presidente da República e ex-presidente do Senado e do Congresso, José Sarney.
A ministra Rosa Weber, falando representando a Suprema Corte, visto que Barbosa também é considerado um dos fundadores do STF disse que ele foi patrono do Corte.
“ Homem de incontáveis talentos, a memória e a obra de Ruy, esse brasileiro ímpar, patrono do Senado Federal e dos advogados, são referenciadas por todos, revestindo-se de relevância singular também para a história da nossa Suprema Corte, que ontem, 28 de fevereiro, completou 132 anos, instalada que foi sob a égide da nossa primeira Constituição republicana, para a qual Ruy Barbosa tanto contribuiu. Por isso, logo mais à tarde, também será homenageado na sessão plenária do Supremo Tribunal Federal.”, disse.
Sarney disse, entre outras coisas em sua longa fala, que Rui Barbosa era um santo político brasileiro.
“Com Ruy Barbosa, hoje, nós comemorarmos 100 anos da sua morte é comemorarmos 100 anos da morte de um santo brasileiro, santo político, santo da inteligência nacional, santo da glória de todo o nosso país.
A data nacional lembrará, durante toda a existência do país, a existência de Ruy Barbosa, porque Ruy, podemos dizer, foi o construtor da República. Foi ele quem tinha a formação, a capacidade, a cultura para saber do que se precisava para se estruturar o país, a começar por ser ele o fundador da República.”, disse.
Veja a íntegra dos discursos de Rosa Weber e José Sarney:
Bom dia a todas e todos.
Eminente Senador Rodrigo Pacheco, Presidente do Congresso Nacional e do Senado da República, cumprimento V. Exa., agradecendo o honroso convite para estar aqui e peço licença para, na pessoa de V. Exa., saudar as demais autoridades integrantes da Mesa, bem como as Sras. e os Srs. Parlamentares, todos os presentes e os que nos assistem na forma telepresencial.
É com enorme honra e imensa alegria que, na condição de Presidente do Supremo Tribunal Federal, retorno neste 1º de março de 2023 a este Congresso Nacional, após a abertura do ano legislativo, em que aqui estive, em 2 de fevereiro último, desta feita para homenagear Ruy Barbosa por ocasião do centenário do seu falecimento.
Homem de incontáveis talentos, a memória e a obra de Ruy, esse brasileiro ímpar, patrono do Senado Federal e dos advogados, são referenciadas por todos, revestindo-se de relevância singular também para a história da nossa Suprema Corte, que ontem, 28 de fevereiro, completou 132 anos, instalada que foi sob a égide da nossa primeira Constituição republicana, para a qual Ruy Barbosa tanto contribuiu. Por isso, logo mais à tarde, também será homenageado na sessão plenária do Supremo Tribunal Federal.
Com o olhar voltado para o nosso sistema de justiça, em recorte que me imponho tal a riqueza da personalidade multifacetada de Ruy, relembro que, instalada a República e promulgada a Constituição de 1891, foi determinante a atuação subsequente de Ruy em memoráveis causas perante o Supremo, como o Habeas Corpus 300, pela solidez de sua argumentação quanto às novas funções republicanas do Poder Judiciário, com base em doutrina norte-americana, para a gradual afirmação da independência do Poder Judiciário em face de arbitrariedades que desrespeitavam a Constituição em vigor e para sedimentação da prevalência dos direitos individuais sobre os atos ilegais de governo.
Partia ele da premissa inegociável de que, entre um princípio constitucional fundante e uma necessidade política momentânea, o princípio haveria de prevalecer.
Ruy Barbosa foi figura fundamental na estruturação político-jurídica de nossa República, defensor do federalismo, da República e da tripartição dos Poderes, bem como da consequente atribuição ao Judiciário da prerrogativa de análise da constitucionalidade dos atos normativos, o Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição.
Verdadeiro estadista republicano, não temia se indispor com governantes que, à sedução autoritária, flertavam com a desconfiguração constitucional. No Supremo, dele dizia o Ministro Pedro Lessa, outro grande vulto das letras jurídicas, que - aspas - "tudo quanto Ruy falasse era sempre importante ou para a causa ou para que se pudesse aprender", fecho aspas.
Na sede da Rua do Lavradio, no Rio de Janeiro, Ruy defendeu muitos dos seus inimigos políticos, sem procuração e de forma graciosa. Era ele mais patrono da lei do que da parte. São suas as seguintes palavras: "Ensinei com a doutrina e o exemplo, mas ainda mais com o exemplo do que com a doutrina, o culto da legalidade, as normas e o uso da resistência constitucional, o desprezo e o horror da opressão, o valor e a eficiência da Justiça, o amor e o exercício da liberdade".
No centenário de nascimento de Ruy, o Ministro Laudo de Camargo, então Presidente do Supremo, resgatou a manifestação quando da aposição do busto de Ruy, Presidente Pacheco, na nossa Corte. Foi dito à época:
[...] que coloquemos neste recinto para que ele presida espiritualmente as nossas sessões e inspire nossos julgamentos, o busto de Ruy Barbosa, o brasileiro que mais alto elevou o nome do Brasil no estrangeiro, o pontífice máximo de nosso Direito Constitucional, o advogado sem par, cujas razões são preciosas monografias, que esgotaram as matérias, nada deixando a respigar.
O resgate dessas palavras bem evidencia a ignomínia da atitude daqueles que, impregnados de ódio irracional, em sanha deplorável, depredaram as instalações do Supremo em 8 de janeiro último, o dia da infâmia, atingindo entre tantos objetos de valor histórico e cultural esse mesmo busto de Ruy, com o qual me deparei, tristemente tombado, na noite do mesmo dia 8, em meio a destroços, a base de mármore totalmente destruída. Diversamente do que aqui aconteceu, Presidente Pacheco. Hoje, no prédio restaurado, o busto voltou a seu lugar de honra, mantido, contudo, qual cicatriz, o dano no bronze, fruto da violência que há de ser recordada para que fatos de tal natureza não se repitam.
Cecília Meireles conta que havia, no jardim da casa de Ruy, uma escultura representando a cena de uma águia de asas abertas a se defender de uma serpente que lhe enroscava o colo e a afastá-la com as garras, evitando-lhe o veneno. Para a poeta, essa estátua não poderia estar em lugar outro que não a casa de Ruy. Escreveu ela: "No lago do seu jardim, a grande águia de asas abertas continua a defender-se da retorcida serpente. E pode ser que um dia, sem a ter sufocado na miséria do lodo, a arrebate, perdoada, até a altura do sol.".
O sol não se apagou, Presidente Pacheco. Segue fulgurante. Que inspirados em Ruy e louvando sua memória prossigamos sempre, frente a qualquer aventura antidemocrática, com a mesma determinação altiva da águia que imobiliza a serpente.
Muito obrigada. (Palmas.)
Discurso de José Sarney:
Peço aos Srs. Senadores que compreendam a minha emoção neste momento.
Nesta Casa, passei 40 anos. E jamais pensei em voltar a esta tribuna. Fiz questão de falar daqui para relembrar esses anos todos e reverenciar o Senado e os grandes oradores que por aqui passaram.
Sr. Presidente do Congresso Nacional, Senador Rodrigo Pacheco, agradeço-lhe a gentileza de convidar-me para assistir a esta sessão e, em seguida, convidar a Academia Brasileira de Letras para também fazer-se representar aqui.
Há três dias, recebi, do Presidente Merval Pereira, o pedido para que aqui viesse e representasse, como decano daquela casa, a casa de Machado de Assis.
Mais uma vez, agradeço, pessoalmente, mais essa gentileza que recebo de V. Exa.
Exma. Sra. Ministra Rosa Weber, que tanta dignidade tem dado à Presidência do Supremo Tribunal Federal; Senador Otto Alencar, brilhante representante do Estado da Bahia; Sr. Deputado Federal Otto Alencar Filho; Sr. Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Sr. José Alberto Simonetti, que tem sido um baluarte da defesa dos direitos humanos à frente da Ordem dos Advogados do Brasil, Coelho Neto dizia que dos santos não se comemora a data do nascimento e, sim, a da sua morte. No momento, o que nós estamos fazendo é justamente comemorar a data do centenário da morte de um dos ídolos do nosso país, podemos dizer, de um dos seus fundadores.
O Brasil é uma construção civil, não foi feito em batalhas, não foi feito em guerras, e essa, sem dúvida, é sua característica maior que marcou o espírito brasileiro, voltado para a paz, levado à conciliação e desejoso sempre que todas as soluções sejam resultado de um consenso de opiniões.
Se quiséssemos arrolar os que foram os fundadores do nosso país, colocaríamos, em primeiro lugar - porque é dele este e irremovível -, José Bonifácio de Andrada; foi ele que realmente estruturou o país. Há três anos, ele chegava ao Brasil antes da Independência e, vindo da Europa, participando das cortes de Lisboa, onde se encontrava a representação do Brasil, trouxe na sua formação e no seu brilhantismo o que ele pensava e a sua missão de fazer do Brasil um grande país. E foi assim que José Bonifácio, essa figura excepcional, foi o estruturador do Estado brasileiro.
Tão grande era a sua visão que até hoje relembro que ele dizia que a independência não se completou por causa de dois fatos: 1º) não resolvemos a questão dos escravos; 2º) não resolvemos a questão dos índios, que pesa até hoje para que os homens do presente e do futuro consigam resolvê-la.
Não podemos deixar de reconhecer, por outro lado, do país, a parte física. E aí nós temos de colocar a figura do Barão do Rio Branco, porque foi ele quem - também vindo da Europa, diplomata, representante do Brasil em vários lugares - delimitou, resolveu as questões das fronteiras, de tal modo que delineou o formato do Brasil. E não nos deixou nenhuma herança, nenhuma hipoteca de luta por fronteiras. O Brasil, assim, pode dizer que chegou sem esse peso, que é sempre o princípio das guerras, das dissensões e das incompatibilidades entre os povos. Devemos, portanto, a Rio Branco essa parte física do nosso país.
Em seguida, nós poderemos invocar a figura de Joaquim Nabuco. Nabuco criou o dogma da questão racial, reconhecendo nossas raízes negras na formação do nosso caráter e da nossa convivência. Lutou, passou a sua vida inteira nessa luta e criou uma consciência nacional para que assim o fizéssemos.
Eu queria saudar - e passei da hora na saudação da Mesa, na pressa dos 5 minutos que a Mesa me permitiu falar -, também, o povo baiano, a Bahia, que nos deu esse homem que tem dentro vários homens - era um poliedro -, pela sua inteligência, pela sua capacidade, pela sua cultura. Jornalista, um escritor, intelectual, pensador, enfim, Ruy Barbosa era um monumento da inteligência nacional.
Nessa lista da formação do nosso país, teríamos que colocá-lo, porque foi o formulador da doutrina civilista do nosso país, que predominou, como eu disse, no caráter nacional e consagrou o dogma do poder civil, que é a síntese de todos os Poderes, de tal modo que até hoje chegou ao manual de doutrina da Escola Superior de Guerra para dizer que o poder civil é a síntese de todos os poderes - militar, econômico, político -, tão forte que hoje faz parte do pensamento das nossas Forças Armadas. que predominou, como eu disse, no caráter nacional e consagrou o dogma do poder civil, que é a síntese de todos os Poderes. De tal modo que até hoje chegou ao manual de doutrina da Escola Superior de Guerra para dizer que o poder civil é a síntese de todos os Poderes - militar, econômico, político -, tão forte que hoje faz parte do pensamento das nossas Forças Armadas.
Eu já disse que dos santos não se comemora a data do nascimento. Se comemoram os seus feitos, se comemoram os seus milagres. Se comemora a sua doutrina, se comemora a sua pregação. Se comemora a sua vida. E a sua morte é que constitui a sua vida. Com Ruy Barbosa, hoje, nós comemorarmos 100 anos da sua morte é comemorarmos 100 anos da morte de um santo brasileiro, santo político, santo da inteligência nacional, santo da glória de todo o nosso país.
A data nacional lembrará, durante toda a existência do país, a existência de Ruy Barbosa, porque Ruy, podemos dizer, foi o construtor da República. Foi ele quem tinha a formação, a capacidade, a cultura para saber do que se precisava para se estruturar o país, a começar por ser ele o fundador da República. Fundador por quê? Porque foi ele quem fez a Constituição da República. Foi ele quem redigiu a Constituição da República e, redigindo a Constituição da República, deu os parâmetros que devíamos seguir com o país.
Ruy Barbosa tinha suas paixões. Entre as instituições que ele fundou, e são quase todas as grandes instituições nacionais, o Supremo Tribunal Federal, na qual ele deu um exemplo de que, num dia em que perdeu o habeas corpus que tinha feito para anistia da Revolta da Marinha, se ajoelhou e beijou a mão do ministro que tinha sido o único voto que ele tinha no Supremo Tribunal Federal.
É dele a frase de que "nesta Casa [que era o Supremo Tribunal Federal], repousam a guarda dos direitos de todos os cidadãos do país".
Nos 50 anos da sua atividade política, para que se veja como os tempos mudaram, o Brasil inteiro levantou-se, decretou vários dias de feriado e foi uma festa nacional pela existência deste homem. E toda a nação louvava o grande gênio, que até louvava o grande gênio que até no exterior ele conseguiu o título de águia de Aia porque levantou a doutrina que ficou até hoje, que era muito justa e muito reivindicada, da igualdade de todas as nações pequenas ou grandes. Elas deviam ter o o mesmo peso internacional.
A data de hoje, portanto, lembrará durante toda a existência porque Rui foi o construtor da república. Ele tinha a sua paixão, suas paixões, entre as instituições que fundou. Citei o Supremo Tribunal Federal, citei o Senado, vou citar o Senado aqui, onde ele passou trinta e um anos. Fez os seus grandes discurso, um deles que durou quatro horas, e, quando perdia uma eleição, ele levava muito tempo falando nessas paredes que não são aqui porque são eternas, elas estão na eternidade. Mas ele, a sua voz, deixando nas dez vezes candidato a presidente da república, dez vezes perdeu a eleição, e, em todas elas, mesmo tendo perdido, ele deixou para o país as ideias que ele pregou, ideias civilistas, as ideias dos direitos humanos. Ele deixou a as ideias que marcaram e que até hoje marcam o país, que é a nossa consciência civilista de todos nós. Em nenhum deles, em nenhuma das suas derrotas ele deixou vazios; ele encheu essas derrotas de pensamentos, pensamentos sobre o Brasil, que ele amava tanto, pensamentos sobre como devíamos nos estruturar, pensamentos de como nós devíamos nos comportar. Esses pensamentos ele deixou como exemplo para que todos nós políticos pudéssemos seguir aquilo que ele pregava - e já velho, com 74 anos, se não me falha a memória. E já podia falhar com 93 anos. Então, com noventa e quatro anos, ele fazia um comício disputando a presidência da república nos limites com Minas Gerais. E ele então disse: "vou falar baixo para que o povo de Minas não ouça que o velho Rui Barbosa ainda está aqui pedindo votos na Bahia, a sua terra."
Sendo um grande intelectual, ele foi um dos fundadores da academia, mas reconhecia que o lugar principal era realmente o de outro brasileiro noutra área: Machado de Assis, esse grande também monumento das letras nacionais. Mas é gigantesca a sua obra. Os milhares e milhares de páginas de oratória e pareceres jurídicos e pareceres jurídicos.
Jornalismo combativo; projetos de lei, que incluem, não podemos esquecer - vou repetir -, a Constituição de 1891; a Lei Saraiva, a Lei Saraiva que era a lei da reforma eleitoral que se pedia no Império a todo tempo - acusava-se as eleições a todo tempo de eleições fraudadas. Precisava-se de uma lei eleitoral. Então, foi ele quem redigiu a Lei Saraiva, apresentada por Saraiva, que era o grande homem que, durante todo o tempo do Império, defendia a reforma da legislação eleitoral.
Era um gramático, estudioso da língua. Calculem que ele chegava ao detalhe de escrever na réplica a Carneiro Ribeiro 19 páginas sobre a vírgula, dizendo que depois de "ou" - da conjunção - não se podia colocar vírgula, chegando a esse detalhe. De tal modo era a vontade dele de conhecer até as pequenas coisas.
Foi o revisor do Código Civil. Se não foi o autor, dele participou em muitas e muitas páginas.
Hoje, nesta tribuna - a que, volto a dizer, jamais pensei em voltar -, falo também como representante da Academia de Letras, onde sou decanto, há 43 anos ocupo a cadeira de José Américo naquela casa, para louvar e colocar, Sr. Presidente, se o senhor permitir, uma coroa de sonetos, como se dizia naquele tempo, em Rui Barbosa, na sua estátua, que vela pelo Plenário, vela de tal maneira que expulsou os seus invasores para que eles aqui nele não tocassem.
O Senado era a sua paixão. Ele foi Vice-Presidente duas vezes, durante longo tempo. Aqui fez os seus mais brilhantes discursos. Creditou a esta Casa a integridade do país. Ele disse que o Brasil, quer dizer, a unidade nacional que foi feita foi possível por causa de duas coisas: do Senado vitalício e do Conselho de Estado.
Aqui está velando pela Casa o seu busto. Velando pela Casa, mas pelo que ela representa, velando pela democracia, velando pelos ideias democráticos, velando pelos direitos humanos, velando pelas liberdades civis, velando pelas liberdades individuais, que ele tanto defendeu no país inteiro.
Eu coloco essa coroa de sonetos, como se dizia antigamente no seu tempo, para santificar a sua glória, lembrando o primeiro centenário da morte de um dos brasileiros do passado primeiro centenário da morte de um dos brasileiros do passado e do futuro. Não são cem anos, são cem anos mas serão enquanto no país existir a lembrança entre os seus fundadores desse grande homem que honra e orgulha todos nós: Ruy Barbosa. (Palmas.)
(da redação com informações de assessoria. Edição: Genésio Araújo Jr.)