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  • Contato Brasil, 15 de junho de 2025 04:23:49
Nordestinas
  • 14/06/2025 07h38

    OPINIÃO: Pode um país ter um custo pra chamar de seu?

    A redução na taxa de juros e a renegociação da dívida pública são os elementos essenciais que deveriam figurar em qualquer projeto para o país
    Foto: Math Financeira

    Os números , os custos, a sociedade

    Por Alexandre Lyra 

    O Custo Brasil foi um conceito adotado pela mídia ali pelo fim do século passado para dar um pouco de objetividade à reclamação geral do empresariado acerca do alto custo para produção das mercadorias no Brasil, internamente e também em relação ao exterior. O conceito é resultado da agregação de uma série de fatores e indicadores, que possibilitariam mostrar um elevado custo adicional que se tem para produzir no Brasil, comparado a outros países mais produtivos, colocando o país numa condição desfavorável de competitividade internacional. Esses fatores, notadamente, estavam ligados à presença excessiva do Estado na economia ou à sua atuação deficiente, atrapalhada ou autoritária, colocando pontos diversos que poderiam ser equalizados com uma recalibragem em seu tamanho e na forma de governança.

    Os elementos colocados para compor o custo Brasil seriam “legislação trabalhista (com excesso de encargos sociais); institucionais (excesso de burocracia para a instalação de empresas exportadoras); tributários (excesso ou cumulatividade de tributos); problemas de infraestrutura (mal conservação das estradas, deficiência de malhas ferroviária e hidroviária, comunicações, portos e aeroportos precários e de alto custo); e corporativas (atuação de sindicatos de trabalhadores sobre certos tipos de atividade” (. https://www12.senado.leg.br/manualdecomunicacao/guia-de-economia/custo-brasil ).

    Como se pode ver, à exceção do último aspecto, pontual, todos demais se referem direta ou indiretamente à atuação do Estado, atribuindo a esse a responsabilidade pela baixa produtividade nacional. Desde a colocação do conceito alguma coisa evoluiu, mas alguns elementos continuam bem presentes. Comentemos brevemente.

    Em primeiro lugar, a produtividade no país não é homogênea, há setores com produtividade mais elevada que outros, sendo que em alguns deles o país é competitivo internacionalmente e, tendo crescido constantemente nesse indicador (https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/11199/1/td_2764.pdf ), chega a ser referência mundial. Trata-se, em particular, do setor agropecuário, onde o capital abunda e há toda uma cadeia de estímulos, governamentais, com vistas à geração de divisas, além de apoio histórico pelas mãos de outro braço estatal, a EMBRAPA. Mesmo esse setor reivindica melhoras diversas na infraestrutura e menor tributação (para lucrar mais, uma vez que seus preços já são competitivos). Esse setor, e outros poucos, entretanto, são pontuais, a maioria da economia tem produtividade média abaixo da média mundial, mas a razão disso não é exatamente o custo Brasil, pois como visto, podemos ser bem produtivos quando há aporte de capital e tecnologia. Mas há, especialmente, alguma dificuldade em qualificar mão de obra, e isso, de fato, exige um investimento significativo na educação e na ciência em geral. 

    Há a questão da gestão, que sempre pode ser trabalhada, e tem sido (uma vez que o Estado hoje cobra produtividade de seus funcionários, principalmente os concursados a partir de 1988), mas já demonstrei em outro texto anterior, que a carga tributária no país não é alta considerando o nível mundial, e que a rubrica dos juros é grande vilã (dragando quase 50% de toda receita orçamentária), o que nos leva novamente ao ponto central da questão: a defesa dos interesses nacionais. Quem quer realmente a eliminação do custo Brasil tem de defender a redução significativa dos juros e a renegociação da dívida pública para o governo ter recursos disponíveis para investir os montantes altos exigidos nas áreas da educação, da ciência e da infraestrutura.

    A redução na taxa de juros e a renegociação da dívida pública são os elementos essenciais que deveriam figurar em qualquer projeto para o país, mas são o básico, pois os gastos com as áreas indicadas precisam ser muito pensadas para chegar a uma formatação que venha a ser submetida ao julgamento especializado e ao debate da população em geral. Um programa estruturante é complexo e pode ter mais de um viés.

    Que educação adotar? Que infraestrutura escolher? Quais são as prioridades entre as possibilidades?

    Uma análise mais ampla do problema aponta origens históricas econômicas e políticas que têm que ser consideradas para o encaminhamento de soluções. O que tem que mudar é a forma como o problema é colocado. Inicialmente é colocado como meramente técnico, com uma falsa complexidade quantitativa que evita a objetividade política; o centro da questão. O essencial não é redução de impostos, mas redirecionamento dos gastos governamentais, diminuindo os custos financeiros para viabilizar o aumento dos gastos estruturantes necessários. É melhor não ter um custo pra chamar de seu, então entendamos o problema em sua dimensão total para expulsar essa má companhia nacional.

     

    * Professor titular do departamento de economia da Universidade federal da Paraíba.

     


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