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- Contato Brasil, 22 de maio de 2025 04:20:47
(Brasília-DF, 21/05/2025) No final da manhã desta quarta-feira, 21, o ex-comandante da Aeronáutica no Governo de Jair Bolsonaro, o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior foi ouvido na condição de testemunha apontada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pelas defesas de três dos oito réus na Ação Penal (AP) 2668, que apura tentativa de golpe de Estado e outros crimes.
Somenteo tenente-brigadeiro prestou depoimento ao ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal, e que conduz as audiências de instrução. O ministro Luiz Fux também acompanhou a audiência, realizada por videoconferência.
O depoimento começou às 11h30 da manhã e durou cerca de uma hora e meia. Baptista Júnior foi interrogado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, na condição de acusador e autor da ação penal, e ouvido pelos advogados de defesa dos réus do chamado Núcleo 1 ou Núcleo Crucial da articulação golpista.
Como foi
Baptista Júnior disse que o ex-presidente Jair Bolsonaro levou ao comando das Forças Armadas a ideia de instaurar um Estado de Defesa no país, no final de 2022, para impedir a posse do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.
O Tenente-Brigadeiro do Ar também relatou que foi discutida a possibilidade de prisão do ministro do STF Alexandre de Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Segundo o ex-comandante da Aeronáutica, a tentativa de ruptura democrática não se concretizou por uma razão: "a não participação unânime das Forças Armadas".
Baptista Junior disse que o único que se colocou à disposição do plano era o então comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, que também é réu no processo.
Baptista Júnior relatou reuniões que envolveram o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e os três comandantes das Forças Armadas. Bolsonaro também participou de algumas delas.
Segundo ele, em um encontro em 14 de dezembro, apenas com a participação dos militares, o ministro da Defesa apresentou um documento para uma medida de exceção no país, com a instauração de Estado de Defesa ou Estado de Sítio.
O ex-comandante da Aeronáutica disse, então, que perguntou se o documento previa que Lula não tomaria posse. Diante do silêncio do ministro da Defesa, ele disse ter entendido que sim e se retirou do encontro.
"Eu perguntei: 'esse documento prevê a não assunção no dia 1º de janeiro do presidente eleito?' Quando eu perguntei isso, ele ficou calado. E logicamente que nós temos afinidades, conhecimentos há muito tempo, eu entendi que estava previsto isto", relatou.
"Eu falei: 'não admito sequer receber este documento, não ficarei aqui'. Levantei, saí da sala e fui embora", disse também.
"O Garnier não falou nada e o Freire Gomes também condenou a possibilidade de nós avaliarmos aquele documento. Eu saí da sala. Não sei o que aconteceu depois", continuou.
Baptista Júnior disse ainda que, após sua recusa em participar do plano de ruptura democrática, sofreu muitas pressões, inclusive contra sua família.
Ele apontou como autores da pressão Braga Netto e o empresário Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho, neto do ex-presidente ditador João Figueiredo (1979-1985).
O ex-comandante da Aeronáutica contou que, inicialmente, estava se discutindo a possibilidade de uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), diante da perspectiva de um cenário de convulsão social no país após a eleição de 2022.
Citou como exemplo de preocupação mobilizações de caminhoneiros e os acampamentos em frente a quartéis militares.
Baptista Júrnior disse, porém, que passou a ficar desconfortável quando as conversas passaram a abordar medidas de exceção que não teriam fundamento.
"A GLO que nós militares estávamos trabalhando era a GLO para o caso de uma convulsão social no Brasil. Nós não estávamos trabalhando com uma GLO para qualquer outro objetivo que não esse", afirmou.
"Tanto que, no meu depoimento [à Polícia Federal], eu disse isso, eu falei para o presidente Bolsonaro: 'aconteça o que acontecer, no dia 1º de janeiro vocês não será presidente", continuou.
'Não vamos apoiar qualquer ruptura nesse país'
Questionado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, se foi cogitada a prisão de autoridades, o ex-comandante da Aeronáutica confirmou que havia a intenção de prender Alexandre de Moraes.
"E eu lembro bem que nisso daí teve a seguinte discussão: vai prender o presidente Alexandre Moraes, o presidente do TSE? Vai. Amanhã o STF vai dar um habeas corpus para soltar ele. Vamos prender os outros 11? Mas aí era um brainstorm buscando uma solução que já estava no campo do desconforto. Pelo menos para mim estava", afirmou.
Baptista Júnior disse também ter estranhado quando o general Augusto Heleno, então chefe do Gabinete de Segurança Institucional, lhe disse que tinha sido convocado para uma reunião de emergência com Bolsonaro no dia 17 de dezembro, um sábado.
Os dois estavam juntos na cerimônia de formatura de novos oficiais da Aeronáutica e Heleno lhe pediu uma carona no voo de volta para Brasília.
Segundo Baptista Júnior, Heleno não disse o teor da reunião, mas ele entendeu que seria para discutir uma ruptura democrática.
Por isso, o chamou para uma conversa reservada e relatou ter dito o seguinte:
"Por unanimidade do alto comando da Aeronáutica, não vamos apoiar qualquer ruptura nesse país. Se alguém for bancar isso, saiba quais são as consequências", relatou.
Ele não detalhou a reação de Heleno a sua fala. Disse que ambos voltaram no mesmo voo para Brasília sem tocar mais no assunto.
Baptista Júnior: Freire Gomes disse que prenderia Bolsonaro
Baptista Júnior também confirmou que, em uma reunião dos comandantes das Forças Armadas com Bolsonaro, Freire Gomes chegou a dizer que teria que prender o presidente, caso levasse adiante alguma tentativa de ruptura democrática. E reforçou que não teria como esquecer uma fala desse teor.
"O comandante do Exército, ele é uma pessoa muito polida, muito calma e muito tranquila, mas ele é muito firme quando precisa", afirmou.
"Não é uma coisa simples você esquecer o que o comandante do Exército disse. A minha palavra eu mantenho, do depoimento [à Polícia Federal] que ele, com toda a educação, disse ao presidente, por hipótese, que, se ele atentasse, ele teria que prender, e eu mantenho isso", reforçou.
O ex-comandante da Aeronáutica afirmou ainda que jamais foi usada a expressão golpe de Estado nas conversas, mas que se discutiam medidas de exceção previstas na Constituição, porém sem que estivessem presentes os fundamentos necessários para que fossem adotadas.
"Colocando na conjuntura, em momento algum o presidente Jair Bolsonaro colocou desta forma, que estava objetivando um golpe de Estado. Mas, durante as discussões, nós começamos a imaginar que os objetivos políticos de uma medida de exceção não eram para garantir a paz social até o dia 1º de janeiro", explicou
"E foi dentro deste contexto que o general Freire Gomes colocou [a possibilidade de prisão do Bolsonaro]. Ou seja, não foi em resposta a uma colocação que o presidente daria um golpe. Mas foi no âmbito desta discussão de possíveis estados de exceção, sem os pressupostos necessários para que eles sejam feitos".
( da redação com assessoria e BBC Brasil. Edição: Política Real)