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(Brasílía-DF, 24/05/2014) O pesquisador e historiador piauiense Chico Castro afirmou que a Coluna Prestes que percorreu boa parte do território brasileiro na década de 20 foi derrotada pelas forças oficiais no Piauí, no início de 1926, quando seus membros foram detidos ou se auto exilaram na Bolívia a partir de 1927.
A Coluna Prestes foi um movimento iniciado dentro do Exército brasileiro, liderado pelos tenentes e oficiais de baixa patente, que entre 1922 a 1926 se rebelaram contra o modelo político adotado à época. Chico Castro garante, ainda, em entrevista exclusiva a Política Real, que todos os integrantes do movimento defendiam teses liberais, incluindo Luís Carlos Prestes, que mais tarde adotou as teses socialistas na militância política.
História recontada
O historiador atendeu a reportagem após participar na última terça-feira, 20, de uma sessão solene na Câmara dos Deputados, que lembrou os 90 anos do início da Coluna Prestes.
“No meu livro, eu levanto algumas teses. A primeira é que a Coluna Prestes acabou no Piauí. O sentido da Coluna acabou no Piauí porque lá em Teresina foi preso o Juarez Távora, que era um dos principais cabeças do movimento. Com a prisão dele a Coluna Prestes retorna (ao centro-sul) até se exilarem na Bolívia”, iniciou.
Mil quilômetros no Piauí
“Muito se escreveu sobre a Coluna Prestes no Sul. Existem vários livros sobre a Coluna Prestes no Paraná, em São Paulo, Mato Grosso, Goiás, no Maranhão. Mas no Piauí, o meu livro é o segundo em 90 anos, que foi lançado em 2007 pelo Senado. E eu fiz um roteiro da Coluna Prestes no Piauí em que eu percorri mil quilômetros. Eu refiz o roteiro da Coluna. Fui aos municípios piauienses em que a Coluna Prestes passou em 1925 e 1926”, contou.
Única derrota
“Eu fiz o mesmo percurso que eles fizeram e entrevistei pessoas de 90 a 100 anos, que na época eram crianças e adolescentes quando a Coluna Prestes chegou ao Piauí. E eu quero esclarecer sobre quando se diz que a Coluna Prestes foi invicta na sua passagem pelo Brasil. Mas eu quero fazer uma breve correção. A Coluna Prestes sofreu uma derrota em Teresina que foi o único lugar em que ela foi derrotada”, falou.
“Então não é verdade que a Coluna Prestes foi vitoriosa no Brasil todo. Lá em Teresina, ela sofreu o revés e teve que sair da cidade em janeiro de 1926. E a repercussão da passagem da Coluna Prestes no Piauí é que foi lá o segundo Estado do país em que mais se aderiu a Coluna Prestes. Um dos maiores números de adesões foi no Piauí”, complementou.
Teses liberais
“Os membros da Coluna Prestes, todos eles, fora o (Luís Carlos) Prestes, aderiram à Revolução de 1930, do Getúlio Vargas. Todos os tenentes de 22 se tornaram aliados de Getúlio Vargas, menos o Prestes. O Prestes foi o único em que não aderiu ao movimento de 1930. E tem outro detalhe, os tenentes de 1922, alguns deles foram generais que fizeram (o golpe de) 64. Por exemplo: Prudente de Farias que era tenente em 1922 foi um dos golpistas de 64”, apontou.
“O Juarez Távora, que era um dos integrantes da ‘Coluna Prestes’, que era da cúpula, tornou-se depois ministro da Aviação do presidente Castelo Branco, da ditadura. Então muita gente que participou da Coluna Prestes nos anos 20 se tornou governista depois. O Prestes foi o único deles que nunca aderiu ao sistema político brasileiro. Por isso, ele ficou preso dez anos no Estado novo. De 35 a 45 ele ficou preso e depois em 64, ele foi novamente perseguido e teve que se exilar no exterior”, acrescentou.
Movimento não era comunista
“Eu quero dizer que a Coluna Prestes, todos os integrantes da Coluna Prestes eram católicos, maçons ou espíritas. Inclusive o Prestes. O Luís Carlos Prestes nunca tinha ouvido falar em (Karl) Marx. Durante a ‘Coluna Prestes’, nenhum deles sabia o que era marxismo. Então essa ideia que a ‘Coluna Prestes’ era formada por comunistas é outra mentira”, registrou.
Brasil desconhecido
“Portanto, o impacto da Coluna Prestes no Brasil foi que eles percorreram 25 mil quilômetros pelo interior do Brasil relatando, posteriormente, a situação em que vivia o povo brasileiro. O Brasil tinha 30 milhões de habitantes em 1925, com 85% a 90% da população analfabeta. As pessoas não tinham sistema de saúde, nenhuma segurança (social) do governo. A agricultura era ainda medieval e não havia direito algum. A Coluna Prestes revelou para o Brasil urbano o que ocorria no Brasil rural. O abandono da população brasileira a sua própria sorte”, comentou.
Prestes socialista
“Posteriormente no exílio, na Bolívia, que o Luís Carlos Prestes veio a tomar conhecimento das obras de Karl Marx. Mas isso bem depois de ter havido a Coluna. A história oficial diz que o Prestes veio tomar conhecimento sobre os livros de Karl Marx na Bolívia. Mas no meu livro, eu digo que o Prestes teve contato com integrantes do Partido Comunista lá no Piauí, no município de Valença, com emissários do Partidão que foram conversar preliminarmente com o Luís Carlos Prestes”, reforçou.
Governo Goulart
Na oportunidade, o autor do livro Coluna Prestes no Piauí lançado em 2007 pela editora do Senado Federal afirmou também que desde 1964 nenhum presidente da República apresentou um projeto político tão moderno quanto o do ex-presidente João Goulart.
“O projeto político do presidente João Goulart era mais moderno do que qualquer outro projeto político que já foi apresentado de 1964 até os nossos dias. Nenhum presidente depois propôs reformas tão profundas na estrutura econômica, política e social do Brasil como João Goulart se propôs a fazer”, defendeu.
Reformas capitalistas
“E o Brasil apesar de ser uma potência econômica nos anos 60, a classe política brasileira era extremamente conservadora. Porque as reformas pretendidas por João Goulart, que foram tidas como de esquerda, ou comunistas, ou socializantes, na realidade eram reformas dentro do espírito capitalista”, argumentou.
“A reforma agrária não pode ser vista como uma atitude comunizante, ou uma bolchevização do Brasil. A reforma agrária que ele (João Goulart) pretendia implementar estava dentro daquela dinâmica do capital. Uma dinâmica de aumentar a produção agrícola, privilegiar o pequeno produtor e usar as terras agricultáveis com mais intensidade”, destacou.
Invenções dos militares
“Foi ele (Jango) que pretendeu mecanizar a agricultura no momento em que a agricultura brasileira era muito incipiente. Os métodos de exploração da terra eram muito incipientes. Então não é verdade que quando se diz que o João Goulart foi cassado em 64 e o seu governo foi deposto porque ele queria implementar o comunismo no Brasil. Isso aí é uma invenção dos militares numa forma de justificar o golpe de 64 utilizando essa premissa que João Goulart queria tornar o Brasil um país comunista”, finalizou.
(Por Humberto Azevedo, especial para Agência Política Real, com edição de Valdeci Rodrigues)